A compra de
um automóvel usado exige cuidado com a documentação. Nao basta checar se os dados da papelada batem com
os do veículo (número de chassi, motor, placa) ou se há multas, licenciamento ou IPVA em atraso. Há
um risco menos visível e bem mais preocupante: o veículo apresentar alguma pendência jurídica.
Nesse caso, a solução não é tão simples como pagar taxas atrasadas ou contratar
um despachante para resolver problemas no Detran. Em geral, o problema envolve um advogado e alguns anos na Justiça
para desembaraçar esse nó burocrático.
O comerciante paulista Carlos Eduardo Osmak Spina sabe
o que é isso. Há dois anos e meio ele adquiriu um VW Gol Special 2001 numa loja de seminovos e achava que tinha
feito uma boa compra. Isso até que, um ano depois, recebeu a visita de um oficial de Justiça que trazia uma
intimação de penhora do Gol.
“Era referente a uma dívida trabalhista do antigo proprietário,
que colocou o carro como um dos bens”, diz. Ele ainda achou estranho ter recebido essa intimação. “Eu
cheguei a renovar o licenciamento e não apareceu nada.” Indignado, o comerciante foi até a loja em busca
de explicações. “O vendedor me disse para esconder o carro”. Ele pediu o dinheiro de volta, o que
foi prontamente negado pela loja. “Eles falaram para eu me virar, que era problema meu agora.”
O comerciante
foi declarado como fiel depositário (quem cuida de um bem enquanto um processo está em andamento), o que na
prática significa que qualquer dano causado ao Gol terá de ser ressarcido por ele próprio. “Mesmo
esperando pelo resultado final da sentença, legalmente o veículo ainda não é meu, por enquanto.
Portanto prefiro não andar com ele.”
Com a recusa do vendedor em ressarcir Carlos Eduardo, restou processar
a loja. “O carro desvalorizou e eu me prejudiquei no trabalho também, pois perdi dinheiro e tempo com transporte.”
Nesse tempo todo, Carlos Eduardo não conseguiu entrar em contato com o antigo proprietário. “O
pessoal da loja não me abriu os contatos dele. O curioso é que o processo corre desde 1995 e, no meio do caminho,
um veículo ano 2001 entrou na história”.
Pendências jurídicas podem ser descobertas
bem antes que um oficial de Justiça venha bater à sua porta. Renato Mehanna, advogado e professor de direito
da PUC-SP, explica que, para evitar o que aconteceu com Carlos Eduardo, é só pedir antes um histórico
do veículo. “Não é algo complicado. Basta ir ao Detran com os dados do veículo, como número
do Renavam e do chassi.” Ao fazer esse levantamento, a pessoa recebe uma espécie de ficha corrida do veículo.
Para Mehanna, esse procedimento deve ser adotado antes de fechar qualquer negócio. “Isso serve não apenas
para ver processos como o de penhora, mas também para verificar se há multas, IPVA atrasado, se o seguro obrigatório
foi pago, entre outros.”
Se preferir o caminho mais fácil, você pode também procurar um
despachante. Segundo a assistente administrativa Valéria Andrade, da Despachante Espacial, todos profissionais do ramo
possuem um sistema em conexão direta com o Detran. “O resultado sai na hora”, diz. Em uma rápida
pesquisa por estabelecimentos da capital, o valor do histórico varia entre 15 e 40 reais. Se você for um cliente
antigo, pode sair de graça. No Detran, o levantamento é gratuito.
Valéria comenta ainda que no
histórico do veículo não aparecem detalhes. “Em um caso de penhora, por exemplo, aparece indicado
apenas ‘restrição judicial’. Nesse caso, é melhor investigar melhor antes de prosseguir com
a compra”, diz.
De acordo com Mehanna, dependendo de como for a situação, será uma grande
dor de cabeça. No caso de penhora, o advogado é categórico: não compre. “O melhor é
partir para outro negócio.”
Controle de danos
Se você comprou um veículo com pendência
judicial, o que deve ser feito? Nesse caso, procure o advogado e entre com uma ação contra o vendedor ou a loja.
“Se adquiriu o bem de boafé, existe a possibilidade de reverter a penhora. O comprador tem de provar que não
sabia que o carro estava nessas condições no ato da compra”, diz Mehanna. Para isso, você terá
de se valer de documentos ou testemunhas que comprovem isso.
Assim, haveria a chance de o embargo ser revertido, e
o juiz poderia penhorar outro bem do antigo dono. É possível acionar a loja na Justiça por danos morais
e materiais. “Toda essa dor de cabeça pode ser evitada com um simples levantamento no Detran”, afirma Mehanna.
DOCUMENTO
SALVADOR
O histórico do Detran é um documento impresso onde constam os registros de multas, roubos,
restrições administrativas, judiciais e tributárias, entre outros problemas (veja quadro abaixo). Para
Sérgio Dias de Andrade, proprietário da Indaiá Despachantes, na compra de um veículo, tudo tem
que estar limpo ao se verificar esse histórico, sem nenhum tipo de ocorrência. “O ideal é que não
tenha nenhuma ocorrência passada, assim se evita qualquer dor de cabeça no futuro”, diz.
O QUE DIZ,
O QUE SIGNIFICA
Multas: Qualquer infração de trânsito, assim como as municipais ou ambientais
Roubo: O veículo tem um registro oficial de roubo ou furto, sendo procurado pela polícia
Restrições
administrativas: Indica se há algum erro, inconsistência ou divergência nos dados de registro no Detran
Restrições judiciais: O veículo está penhorado ou embargado pela Justiça
Restrições
tributárias: Revela se há imposto atrasado, como IPVA ou licenciamento
Gravame: Se o veículo
foi financiado e ainda não foi quitado, o banco aparece como coproprietário, o que significa que ainda há
parcelas em aberto
Fonte: Quatro Rodas
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