Alavancado por um momento em que a incerteza do mercado sobre a política econômica brasileira se junta à elevação dos juros praticados pelos Estados Unidos, desde setembro o dólar deu um salto de preço, valorizando 12,5% em relação ao real. O valor para compra da moeda saiu de um patamar de R$ 2,20 para R$ 2,60. Apesar de refletir uma situação ruim para a economia brasileira, o dólar valorizado ajude exportadores a retomar contratos no exterior.
INFOGRÁFICO: Confira a oscilação da taxa cambial
Henry Milléo/Gazeta do Povo
Barion Alimentos ganhou competitividade no mercado externo graças à desvalorização do real
Pressão cambial sobre a inflação preocupa
No longo prazo, o dólar caro traz dois problemas: penaliza setores produtivos que precisam importar insumos e pressiona a inflação. Esse é o temor do executivo Clecio Luiz Chiamulera, diretor da Ibema, fábrica de papel-cartão em Turvo, na Região Central do Paraná. O negócio está em uma encruzilhada: o momento permite maior margem de lucro nas exportações, mas matérias-primas como celulose e químicos têm preços atrelados ao dólar. “É uma fase boa, mas não de ficar eufórico”, resume.
A inflação é problema citado também por exportadores de commodities (principal categoria dos produtos que saem no Paraná). A carne de frango, por exemplo, encara bom momento, com a retomada pontual de exportações para a Rússia. Comparando períodos de janeiro a outubro, neste ano o volume aumentou 11,6% em relação a 2013. “O frango estaria no melhor dos mundos se considerássemos só o segmento”, diz Domingos Martins, presidente do Sindicato das Indústrias de Produtos Avícolas do Paraná (Sindiavipar). “Mas e se houver desemprego? Nenhum avicultor pode abandonar o mercado interno.”
Por enquanto, o câmbio não teve impacto expressivo sobre índices inflacionários. O Índice Geral de Preços por Mercado (IGP-M), que abrange valores de insumos, fechou outubro em 0,28% – no ano, o acumulado é de 2,03%. É menos que em 2013, quando o IGP-M bateu em 4,59% nos primeiros dez meses. No ano, foi de 5,52%. “Como o governo está adotando a política de subir juros, de certa forma está controlando o efeito cambial sobre a inflação”, diz o economista Paulo Melo Garcia, professor da Universidade Federal do Paraná.
O economista-chefe da Fiep, Maurílio Schmitt, avalia que o câmbio se refletirá na inflação em meados de 2015. “A economia está tão deprimida que o mercado vai demorar a transformar isso em preço, mas como temos memória indexadora forte, logo vai aparecer”, diz. Ele ressalta que o câmbio não basta para a retomada das exportações por setores que amargam ano ruim, como veículos, máquinas e autopeças. “Competitividade não se conquista a partir de câmbio, mas aumentando a produtividade.”
O problema é a atual taxa cambial só virá a surtir efeitos em três a seis meses, já que os contratos de exportação são geralmente de médio e longo prazos. Além disso, retomar mercados perdidos nos últimos anos é um processo lento, que depende de novas negociações. Isso ajuda a explicar por que, em outubro, a balança comercial brasileira fechou com exportações 20% abaixo do mesmo mês de 2013 – um total embarcado de US$ 18,3 bilhões.
A opinião mais recorrente do setor é de que, se o real valorizado derruba a competitividade de produtos brasileiros, a variação acentuada do câmbio também não ajuda. “O câmbio deveria ser uma taxa mais estável e não ficar oscilando. Isso prejudica o planejamento das empresas’, diz Fabio Faria, vice-presidente da Associação de Comércio Exterior do Brasil (AEB), que representa empresas. “Na indústria, tudo está problemático, os preços subiram muito e o Brasil perdeu competividade. Retomar mercado demora, não é de um dia para o outro”. Ele cita que exportadores têm dúvidas sobre a rentabilidade futura, já que outros custos também devem subir.
Ainda assim, a variação permitiu que exportadoras firmassem contratos que se mostraram inviáveis no fim de novembro de 2013, por exemplo, quando o câmbio estava em R$ 2,25. Ou seja, empresas que já vendem para fora ganharam mais abertura para negociar com clientes conhecidos. “Isso agrada aos exportadores. Esse patamar [R$ 2,60] deve ir até o fim do ano e a previsão do Banco Central é fechar 2015 em, no máximo, R$ 2,70”, diz o empresário Rommel Barion, que coordena o Conselho de Negócios Internacionais da Federação das Indústrias do Paraná (Fiep).
Ganhos
Dono de uma fábrica alimentícia em Colombo, na Grande Curitiba, Barion reconhece que as vendas para o exterior aumentaram. Um recente contrato, para a Mauritânia, diz respeito a uma negociação que foi suspensa em 2013 porque a caixa do produto saia por US$ 27. Agora, que está US$ 24, o negócio foi fechado. “Há, sim, um ganho de competitividade, ainda que só pelo câmbio, não no custo geral da operação”, avalia.
Outro pé atrás do setor é sobre as condições em que o dólar se valorizou. Principal responsável, o impacto da política monetária dos EUA deve chegar a outros países com que os produtos brasileiros competem. “O efeito [ganho no preço] é imediato em mercados dolarizados, mas empresas têm que ajustar preços pensando nos outros países com que disputam mercado”, afirma Mario Teixeira, gerente de exportações da Kit’s Paraná, moveleira de Arapongas (PR) que exporta até 8% da produção. “E em alguns mercados não dolarizados, como Paraguai e Chile, dólar valorizado é um falso ganho de competitividade.”
Importação
Produtos de Natal ficam mais caros, mas culpa não é do dólar
Alimentos e bebidas
importadas que têm grande saída no Natal devem ficar bem mais caros neste ano. Segundo a Associação
Brasileira dos Exportadores e Importadores de Alimentos e Bebidas (Abba), em média os reajustes ficarão em torno
de 10% a 15%. Há casos específicos de aumento de preço, como o do damasco seco, que está 70% mais
caro do que no ano passado devido à quebra da safra na Turquia. No entanto, o presidente da Abba, Adilson Carvalhal
Júnior, avalia que, como os contratos de importação para os estoques de Natal são fechados em
julho ou agosto, a alta mais recente da taxa cambial (desde setembro) ainda não teve efeito sobre os preços.
Para ele, contaram mais para o reajuste o aumento nos custos da operação, como transporte e mão de obra.
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