Dentre as ações transformadoras almejadas pelos empresários paranaenses que compõem a diretriz “Aprimoramento da legislação e administração tributária”está o aprimoramento do diálogo sobre interpretações de normas tributárias. Trata-se de um anseio comum a todos os contribuintes brasileiros, que se sentiriam mais seguros na realização dos seus atos se recebessem maiores informações e/ou explicações acerca da nossa incessante legislação tributária.
Como uma medida que, em tese, tentaria instaurar formas de realização desse “diálogo”, foi editada a Medida Provisória 685, de 21 de julho de 2015 (BRASIL, 2015a), que estabeleceu, nos seus artigos 7 a 12, que o conjunto de operações realizadas pelo contribuinte no ano-calendário anterior, aqueles que envolvam atos ou negócios jurídicos que acarretem supressão, redução ou diferimento de tributo, deverá ser declarado à Secretaria da Receita Federal do Brasil (RFB) até 30 de setembro de cada ano, em três hipóteses: quando os atos ou negócios jurídicos praticados não possuírem razões extratributárias relevantes; quando a forma adotada não for usual, utilizar-se de negócio jurídico indireto ou contiver cláusula que desnature, ainda que parcialmente, os efeitos de um contrato típico; ou quando tratar de atos ou negócios jurídicos específicos previstos em ato da RFB (RECEITA FEDERAL DO BRASIL, 2015).
Destaca-se a exposição de motivos de Joaquim Levy, Ministro da Fazenda à época, no envio da proposta de Medida Provisória à Presidência da República (LEVY, 2016), no tocante ao regramento instituído nos artigos 7 a 12:
4. A segunda
medida proposta estabelece a necessidade de revelação de estratégias de planejamento tributário,
que visa aumentar a segurança jurídica no ambiente de negócios do país e gerar economia de recursos
públicos em litígios desnecessários e demorados. A ausência de informações completas
e relevantes a respeito das estratégias de planejamentos tributários nocivos é um dos principais desafios
enfrentados pelas administrações tributárias no mundo. O acesso tempestivo a tais informações
oferece a oportunidade de responder rapidamente aos riscos de perda de arrecadação tributária por meio
de fiscalização ou de mudança na legislação.
5.
Nesta linha, o Plano de Ação sobre Erosão da Base Tributária e Transferência de Lucros (Plano
de Ação BEPS, OCDE, 2013), projeto desenvolvido no âmbito da OCDE/G20 e que conta com a participação
do Brasil, reconheceu, com base na experiência de diversos países (EUA, Reino Unido, Portugal, África
do Sul, Canadá e Irlanda), os benefícios das regras de revelação obrigatória a administrações
tributárias. Assim, no âmbito do BEPS, há recomendações relacionadas com a elaboração
de tais regras quanto a operações, arranjos ou estruturas agressivos ou abusivos.
6. O principal objetivo dessa medida é instruir a administração tributária com informação
tempestiva a respeito de planejamento tributário, além de conferir segurança jurídica à
empresa que revela a operação, inclusive com cobrança apenas do tributo devido e de juros de mora caso
a operação não seja reconhecida, para fins tributários, pela RFB. Ademais, destaca-se que a medida
estimula postura mais cautelosa por parte dos jurisdicionados antes de fazer uso de planejamentos tributários agressivos.
A referida medida foi extremamente combatida, principalmente pelos tributaristas (CONSULTOR JURÍDICO, 2015), primeiramente porque dava à elisão fiscal (planejamento tributário) o tratamento de crime e, eventuais operações não informadas, seriam tratadas como omissão dolosa de informações à Receita Federal, com a consequente aplicação de multa de 150% nos tributos que viessem a ser, posteriormente, lançados em decorrência dessas operações.
Tal oposição surtiu efeito e a referida obrigatoriedade de declaração de planejamento tributário não foi aprovada pelo Congresso Nacional quando da conversão da MP 685/2015 na Lei 13.202, de 8 de dezembro de 2015 (BRASIL, 2015b).
O que se destaca é a tentativa frustrada do Governo de, sob o pretexto de se adequar às medidas adotadas no âmbito dos países da OCDE e G20 para fins de transparência e diálogo entre Fiscos e contribuintes, criar uma medida que, na prática, não teria qualquer condão de consulta ou diálogo entre as partes, mas simplesmente de restringir a atuação dos contribuintes no planejamento de suas atividades. A ausência de intenção de diálogo e transparência fica nítida ao indicar que as informações a serem enviadas à Receita Federal seriam as de operações realizadas no ano anterior, ou seja, sem o qualquer condão de dialogar ou orientar os contribuintes na realização de suas operações, bem como sobre a interpretação de normas tributárias.
Ainda que se revele uma tentativa frustrada e, necessariamente, que não atenda aos anseios dos industriais paranaenses, trata-se de uma sinalização, em especial da Receita Federal do Brasil, de que novos mecanismos possam vir a ser propostos ou adotados, principalmente em virtude das ações realizadas na órbita de instituições como OCDE e G20. Medidas dessa natureza, se bem adotadas e adaptadas a nossa realidade, especialmente se previamente discutidas com especialistas da sociedade, podem vir a convergir com a expectativa da indústria paranaense de aumentar o diálogo com os entes tributantes acerca da interpretação das normas tributárias.
Referências
BRASIL. Medida Provisória 685, de 21 de julho de 2015. Institui o Programa de Redução de Litígios Tributários - PRORELIT, cria a obrigação de informar à administração tributária federal as operações e atos ou negócios jurídicos que acarretem supressão, redução ou diferimento de tributo e autoriza o Poder Executivo federal a atualizar monetariamente o valor das taxas que indica. Diário Oficial da República Federativa do Brasil, Brasília, DF, 21 jul. 2015a. Disponível em: <www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2015-2018/2015/Mpv/mpv685.htm>. Acesso em: 14 out. 2016.
BRASIL. Lei 13.202, de 8 de dezembro de 2015. Institui o Programa de Redução de Litígios Tributários - PRORELIT; autoriza o Poder Executivo federal a atualizar monetariamente o valor das taxas que indica; altera as Leis nos 12.873, de 24 de outubro de 2013, 8.212, de 24 de julho de 1991, 8.213, de 24 de julho de 1991, 9.250, de 26 de dezembro de 1995, e 12.546, de 14 de dezembro de 2011; e dá outras providências. Diário Oficial da República Federativa do Brasil, Brasília, DF, 8 dez. 2015b. Disponível em: <www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2015-2018/2015/Lei/L13202.htm>. Acesso em: 14 out. 2016.
CONSULTOR JURÍDICO. Câmara aprova MP 685 e retira obrigação de informar planejamento fiscal. Publicado em: 17 nov. 2015. Disponível em: <www.conjur.com.br/2015-nov-17/camara-aprova-mp-685-obrigacao-informar-planejamento-fiscal>. Acesso em: 16 out. 2016.
LEVY, J. V. F. Proposta de Medida Provisória à Presidência da República. Disponível em: <www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2015-2018/2015/Exm/Exm-MP%20685-15.doc>. Acesso em: 14 out. 2016.
MP 685. Disponível em: <http://www.machadomeyer.com.br/imprensa/mp-685-e-a-obrigacao-de-declarar-o-planejamento-tributario%3A-ruling-ou-bullying%3F>. Acesso em d maio 2016.
RECEITA FEDERAL DO BRASIL. MP 685 cria o PRORELIT e declaração de planejamento tributário. Publicado em: 22 jul. 2015. Disponível em: <http://idg.receita.fazenda.gov.br/noticias/ascom/2015/julho/mp-685-cria-o-prorelit-e-declaracao-de-planejamento-tributario>. Acesso em: 14 out. 2016.