Cenário da cadeia de hidrogênio verde é debatido no Conselho de Energia
Foram apresentadas pesquisas desenvolvidas no Paraná, que tem potencial para ser protagonista nesse setor
20/06/2023
O potencial do Paraná e do Brasil para a produção de hidrogênio renovável de baixo carbono, apontado como uma das principais soluções energéticas para a descarbonização da economia mundial, foi debatido em reunião do Conselho Temático de Energia da Fiep, no dia 14 de junho. Na ocasião, foram apresentadas pesquisas que vêm sendo desenvolvidas pela Universidade Federal do Paraná (UFPR) e pelo Instituto Senai de Inovação em Eletroquímica (ISI-EQ) para desenvolver essa cadeia produtiva no Estado.
“Todos sentiram, durante a pandemia, a nossa dependência de tecnologias ou insumos externos. Com a questão da energia advinda do hidrogênio, também temos que nos preocupar”, explicou o coordenador do Conselho, Rui Londero Benetti. Ele acrescentou que o Sistema Fiep já vem promovendo ações com o objetivo de auxiliar no crescimento dessa cadeia produtiva no Paraná e, por isso, é importante também conhecer os estudos que estão sendo desenvolvidos no Estado por universidades e institutos de pesquisa.
Para mostrar um panorama do potencial do Paraná e do Brasil nesse setor, o Conselho recebeu o professor doutor Helton José Alves, coordenador do Laboratório de Materiais e Energias Renováveis (Labmater), da UFPR, e diretor técnico-científico da Associação Brasileira do Hidrogênio (ABH2). Instalado no campus de Palotina da universidade, o Labmater iniciou suas atividades em 2011 e atua em projetos de P,D&I e extensão com foco principalmente em análise de gases, rota da biomassa e hidrogênio.
Alves reforçou que o grande desafio atual no mundo é a promoção do desenvolvimento econômico associado ao processo de descarbonização. Nesse ponto, o uso de hidrogênio passa a ser estratégico. Ele apresentou estimativas da Agência Internacional de Energia que apontam um aumento de 5 vezes na demanda por hidrogênio até 2050, em relação ao que foi registrado em 2020. “Esse processo precisa ser associado à produção de um hidrogênio renovável de baixo carbono”, disse.
Geração renovável
O professor explicou que o hidrogênio tem maior quantidade de
energia por quantidade de massa, com um poder calorífico três vezes superior ao da gasolina, por exemplo. O desafio,
porém, é obter a molécula a partir de fontes renováveis de energia. Atualmente, quase a totalidade
do hidrogênio produzido para uso comercial vem de fontes não renováveis, como gás natural, óleo,
nafta e carvão. E o que é produzido acaba sendo utilizado nas próprias refinarias ou, então, na
produção de amônia, direcionada para ureia e fertilizantes nitrogenados. “Essas duas grandes aplicações
são responsáveis por mais de 90% do uso de hidrogênio”, disse o professor.
Nesse cenário, o Brasil surge como um dos países com maior potencial para produzir hidrogênio renovável de baixo carbono, atendendo não apenas o mercado local, mas também a demanda crescente principalmente da Europa. Uma das vantagens, de acordo com Alves, é o menor custo de produção em território brasileiro. “O custo para produção de hidrogênio na Europa, em 2021, chegou a até 8 euros o quilo. O Brasil, nesse sentido, surge como um país que teria potencial para produzir o hidrogênio renovável de baixo carbono a um custo inferior. Temos muitas estimativas que apontam que o hidrogênio pode atingir um custo no Brasil de 1,5 dólar por quilo em 2030 e 1,25 dólar em 2040”, explicou.
Para o professor, o país possui inúmeras rotas que podem ser seguidas para a obtenção do hidrogênio de baixo carbono. Uma delas é a partir da eletrólise da água, utilizando energia elétrica gerada de fontes renováveis, como solar ou eólica. Mas uma rota considerada promissora é a da biomassa. “Quando nós utilizamos biomassa, podemos inclusive não só ter emissões próximas a zero, mas inclusive ter emissões negativas quando nós capturamos o CO2 que é produzido a partir da reforma ou da gaseificação nesse processo. Isso torna o Brasil um cenário muito estratégico para a produção de hidrogênio de baixo carbono”, afirmou.
Alves destacou o enorme potencial de biomassa do país, que ainda é pouco utilizado. Segundo ele, existem pouco mais de 800 plantas de geração de biogás no Brasil, que produzem 2,35 bilhões de metros cúbicos por ano. Isso representa somente 2,7% do potencial existente no país para geração de biogás a partir de resíduos animais, agroindustriais, de esgotos, aterros ou da vinhaça associada à indústria do etanol. “E além das aplicações convencionais desse biogás, como a queima para geração de eletricidade por calor ou a produção de biometano, existe a possibilidade de uma nova rota, utilizando ou biometano ou o biogás para a produção de hidrogênio. O que nós propomos e estudamos na universidade é como trabalhar com essas novas rotas para chegar em um hidrogênio adequado para o uso em células a combustível ou para a indústria de uma forma geral”, explicou.
Nesse aspecto, o Paraná pode se destacar, já que possui uma grande geração de biomassa. “Ter a biomassa disponível nos permite trabalhar com biogás e ter a possibilidade de produzir também vários outros produtos, como a querosene e o metanol”, disse. “O Paraná poderia ser um novo hub de hidrogênio no Brasil, também pela possibilidade de utilizar a eletrólise com a energia renovável que nós temos disponível no Estado”, completou.
Armazenamento e transporte
Além de desenvolver as cadeias de produção de hidrogênio,
outro desafio para esse setor é o armazenamento e transporte da molécula. “O hidrogênio tem uma
densidade muito baixa, principalmente o hidrogênio gasoso, a molécula de H2, que é o que nos interessa
comercialmente. Então existe uma grande dificuldade de comprimir o hidrogênio”, explicou Alves, acrescentando
que a molécula só pode ser liquefeita a temperaturas inferiores a -252 graus celsius.
Uma das soluções é levar o hidrogênio por meio de outras moléculas, como é o caso da amônia. Um tema que vem sendo estudado pelo ISI-EQ, conforme explicou a pesquisadora Francyelle Calegari, que atua na área de desenvolvimento e pesquisa de materiais inteligentes no instituto.
“Vem se pesquisando muito a utilização da amônia para o transporte e armazenamento de hidrogênio devido a questões de segurança, custo e facilidade”, disse. Ela destacou que a amônia é um dos produtos químicos mais comercializados do mundo atualmente, já existindo uma infraestrutura pronta para receber o produto. “Já existem também portos, navios e terminais para hidrogênio, mas não é comparável com a magnitude do que existe para a amônia”, afirmou.
Para ampliar as pesquisas nessa área, o ISI-EQ vai submeter um novo projeto em um edital da Finep voltado para inovações radicais no setor elétrico. O projeto, em parceria com uma empresa do setor, tem o objetivo de desenvolver uma planta-piloto para produção de amônia, nacionalizando tecnologias e resultando, ainda, na fabricação de sulfato de amônia e um revestimento de alta performance para seu uso em fertilizantes.
Na reunião, também foi apresentado, pelo pesquisador Adler de Souza, o trabalho que o ISI-EQ desenvolve na área de tecnologias de células a combustível de hidrogênio, utilizadas principalmente no setor de veículos e transportes, além de residências.