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Publicado em 13/01/2017
O vice-presidente da Anpei, Luiz Mello, foi fonte da matéria “CNPq e Organizações Sociais começam 2017 com orçamento sem lastro”, publicada pelo Estadão no dia 10 de janeiro. Em entrevista ao jornalista Herton Escobar, especializado em ciência e tecnologia, Mello apontou que “o Brasil não vai parar, mas vai andar para trás”, ressaltando que a inovação está na base do crescimento das empresas e dos países.
Confira a matéria na íntegra:
CNPq e Organizações Sociais começam 2017 com orçamento sem lastro
Parte importante dos recursos previstos para este ano foram colocados numa fonte que não tem origem definida, chamada Fonte 900. Entidades científicas chamaram a manobra de ‘operação vergonhosa’. Ministro Kassab garante que orçamento será executado na íntegra.
O Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), principal agência de fomento à pesquisa no país, começou 2017 com um orçamento reduzido e sem saber de onde (ou quando) virão os recursos necessários para o pagamento de suas bolsas.
Segundo a Lei Orçamentária Anual (LOA) aprovada em 15 de dezembro pelo Congresso Nacional, o orçamento total do CNPq para este ano é de R$ 1,67 bilhão, comparado a R$ 1,91 bilhão em 2016 — uma redução de 12% em valores absolutos, sem contar a inflação acumulada no ano, que foi da ordem de 7%. Descontados os gastos com pessoal e reserva de contingência, há um pequeno aumento de 2,6% (abaixo da inflação), segundo números fornecidos à reportagem pelo Ministério da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações (MCTIC).
O orçamento apertado já era esperado pelos cientistas. A surpresa foi ver, após a aprovação da LOA, que R$ 1,1 bilhão dos recursos destinados ao pagamento de bolsas da agência foi colocado na chamada Fonte 900, o que significa que esses recursos não têm origem definida — são “recursos condicionados” à disponibilidade de verbas adicionais futuras; diferentemente da Fonte 100, que é vinculada ao Tesouro Nacional e tem alocação garantida. Ou seja, a princípio, não se sabe de onde virá esse dinheiro nem quando ele será liberado. Por enquanto, é um compromisso sem lastro financeiro — apenas político.
Isso representa 65% do orçamento total do CNPq e 88% do orçamento de bolsas (de R$ 1,25 bilhão) da agência. “É trágico; esse valor simboliza o fechamento do CNPq”, lamentou a presidente da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), Helena Nader.
“Foi uma surpresa, mas já sabemos que a fonte pode ser remanejada e que podemos contar com esses recursos”, disse ontem ao Estado o presidente do CNPq, Mario Neto Borges. “De qualquer forma, ainda aguardamos mais orientações sobre a execução dessa fonte para poder traçar estratégias.”
Perguntado sobre a redução orçamentária da agência para este ano, Borges preferiu ressaltar o esforço que foi feito para executar o orçamento de 2016 na íntegra e ainda quitar todos os restos a pagar de anos anteriores — o que resultou numa execução orçamentária de 137%. “Podemos esperar para 2017 os mesmos esforços e a mesma força de articulação junto ao MCTIC para a recomposição orçamentária do CNPq, como aconteceu no final de 2016.”
O ministro Gilberto Kassab disse também ontem ao Estado que “discordou veementemente” quando soube da mudança de fonte no orçamento, mas que já conversou com a equipe econômica do governo e que isso já é uma “questão superada”. “O Executivo tem uma margem de remanejamento e o orçamento vai ser cumprido na íntegra. Estamos muito tranquilos com relação a isso”, afirmou o ministro, sem esclarecer de onde sairá o dinheiro.
Organizações Sociais
As organizações sociais (OS) vinculadas ao MCTIC estão em situação semelhante à do CNPq. Quase 90% do orçamento destinado a elas foi colocado na Fonte 900: R$ 317 milhões, de um total de R$ 350 milhões.
As OS são entidades privadas, sem fins lucrativos, que são financiadas pelo poder público para prestar serviços de interesse da sociedade. O MCTIC possui contratos com seis delas, incluindo a Rede Nacional de Ensino e Pesquisa (RNP), responsável pela infraestrutura de internet que conecta as universidades e institutos de pesquisa públicos do país, e o Centro Nacional de Pesquisa em Energia e Materiais (CNPEM), em Campinas, que abriga os laboratórios nacionais de Luz Síncrotron (LNLS), Biociências (LNBio), Bioetanol (CTBE) e Nanotecnologia (LNNano).
“Não acreditamos que seja possível que essa medida não será revertida”, disse ao Estado o assessor de relações institucionais do CNPEM, Rui Albuquerque. A não disponibilização desses recursos, segundo ele, inviabilizaria completamente a operação dos quatro laboratórios nacionais, que têm mais de 500 funcionários e atendem a milhares de cientistas do Brasil e do exterior. Todo o orçamento operacional do centro, incluindo salários, vem do MCTIC. “Não trabalhamos com a hipótese de essa fonte não ser alterada”, frisou Albuquerque. “O ministério está bastante sensível a essa questão.”
Dois grandes projetos do CNPEM foram mantidos na Fonte 100: a construção da nova fonte nacional de luz síncrotron (Projeto Sirius, R$ 326 milhões) e a expansão das instalações do LNNano (R$ 15 milhões).
“Operação vergonhosa”
O orçamento do MCTIC disponível para investimentos em Ciência, Tecnologia e Inovação aumentou de R$ 4,8 bilhões em 2016 para R$ 6 bilhões neste ano, segundo os dados fornecidos à reportagem pela própria pasta — um aumento da ordem de 25%.
Desse total, cerca de R$ 1,7 bilhão (28%) foi colocado na Fonte 900. A mudança foi introduzida de última hora pelo Congresso, na votação do projeto orçamentário enviado ao parlamento pelo Executivo. A comunidade científica não foi consultada nem avisada, e demorou alguns dias para perceber a manobra. Em uma nota de protesto, publicada no dia 30 de dezembro, entidades ligadas à área de CTI classificaram o ato como uma “operação vergonhosa”, ressaltando que a Fonte 900 “poderá ser uma mera ficção”.
“Apesar do que afirma o governo, a transferência de recursos da pesquisa para a fonte 900 gerará impactos dramáticos no sistema educacional já em 2017, caso não seja imediatamente revertida, prejudicando milhares de pesquisadores em todo o país”, diz a nota, assinada pela Academia Brasileira de Ciências (ABC) e outras oito entidades da área acadêmica, governamental e empresarial (SBPC, Abipti, Anprotec, Anpei, Confies, Confap, Consecti e Fortec).
“Foi uma supresa para nós. É algo que não estava previsto e ninguém imaginava que poderia acontecer”, disse ao Estado o presidente da ABC, o físico Luiz Davidovich. “Não vamos aceitar isso, de jeito nenhum”, afirmou Nader, da SBPC.
“O governo pode dizer o que quiser, mas não há garantia de que esse dinheiro vai existir”, disse, na semana passada, o vice-presidente da Associação Nacional de Pesquisa e Desenvolvimento de Empresas Inovadoras (Anpei), Luiz Mello. Ele disse que ficou “incrédulo” ao ver a mudança de fonte, e que a sensação que fica é que falar em inovação no Brasil virou “propagando enganosa”. “O Brasil não vai parar, mas vai andar para trás”, concluiu, ressaltando que a inovação está na base do crescimento das empresas e dos países.
“No jogo político, o sequestro das verbas aprovado pelo Congresso Nacional nos parece uma forma não ortodoxa para garantir a aprovação da controversa Lei de Repatriação de Recursos (PL 2.617/2015), de onde supostamente viria a verba capaz de voltar a garantir o pagamento efetivo dos recursos colocados na fonte 900”, diz a nota das entidades.
Perguntado pela reportagem se esses recursos da Fonte 900 estariam mesmo atrelados ao projeto de repatriação, Kassab não respondeu. “O compromisso é que o orçamento será executado”, reiterou o ministro.
Fonte: Anpei
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