Pesquisa desenvolve mandiocas biofortificadas nas cores creme, amarela e rosada
Publicado em 09/11/2015
Mais nutritivas, de maior produtividade, colheita precoce e manejo mais fácil em comparação às
convencionais. Essas são algumas características de seis cultivares de mandioca de mesa, conhecida também
como macaxeira ou aipim, recém-lançadas pela Embrapa e adaptadas para a região do Distrito Federal e
Entorno. O desenvolvimento do material contou com a participação de produtores rurais e técnicos extensionistas.
As novas cultivares são resultantes do programa de melhoramento genético de mandioca de mesa da Embrapa
Cerrados (DF). Após dez anos de pesquisa, a Empresa lançou três cultivares de coloração
da polpa da raiz amarela (BRS 396, BRS 397 e BRS 399), uma cultivar com a coloração da polpa da raiz creme (BRS
398) e duas cultivares com a coloração da polpa da raiz rosada (BRS 400 e BRS 401). As rosadas são enriquecidas
com licopeno, o mesmo nutriente presente no tomate e na melancia e que se mostrou eficaz na prevenção do câncer
de próstata.
Os novos materiais possuem características que atendem demandas tanto de agricultores quanto de consumidores.
São precoces, ou seja, produzem a partir de oito meses, enquanto as cultivares precoces disponíveis no mercado
geralmente começam a produzir dez a doze meses após o plantio. As novas variedades também possuem elevado
potencial produtivo, arquitetura favorável aos tratos culturais, facilidade na colheita, resistência às
principais pragas e doenças, baixo teor de ácido cianídrico (HCN) nas raízes, boa qualidade culinária,
teor mais elevado de carotenoides além de características de importância agronômica e tecnológica.
Participação de produtores familiares
Um dos grandes diferenciais deste trabalho de pesquisa é que ele foi conduzido de forma participativa e envolveu
diretamente os agricultores familiares da região, que testaram no campo os novos materiais. "Sabíamos que nosso
trabalho teria que atender às exigências do mercado produtor e consumidor. Essas novas variedades passaram por
testes preliminares dentro da Embrapa Cerrados, mas tínhamos o desafio de avaliar esses clones biofortificados com
os produtores. Foi quando lançamos mão dessa pesquisa participativa. Ela não preconiza levar pacote tecnológico
para o produtor, mas sim permitir um intercâmbio, uma troca de experiência constante entre o produtor, o pesquisador
e o extensionista", explica o pesquisador Josefino Fialho.
Os primeiros clones de polpa amarela e rosada biofortificados, gerados na Embrapa Cerrados, começaram a ser avaliados
de forma participativa em 2011, tendo sido analisados 13 amarelos e oito rosados. Um dos agricultores que participou do projeto
de seleção participativa foi Paulo César Gonçalves, cuja propriedade está localizada no
Município de Planaltina de Goiás (GO). "Essas variedades são fora de série, só cultivando
mesmo para saber. Elas aceitam bem a irrigação, produzem muito mais rápido", conta.
Já especificamente as cultivares de polpa rosada representam uma nova opção para o mercado de mandioca
de mesa. A coloração diferenciada está relacionada à presença de uma quantidade maior de
carotenoides nas raízes, como o licopeno, que apresenta importantes propriedades antioxidantes. Sendo assim, são
mais nutritivas do que as demais variedades de mandioca de polpa branca e creme. "As pessoas acham estranho num primeiro momento,
mas acabam acreditando que é mesmo mandioca e se interessam ainda mais quando explicamos que ela é mais
nutritiva do que as demais. Tenho certeza de que o mercado dessa variedade vai crescer muito", conta o agricultor Raimundo
Lúcio da Silva, que também participou do projeto.
De acordo com o pesquisador Eduardo Alano, a ideia agora, depois do lançamento dos materiais, é fazer uma
pressão de seleção muito mais forte nas gerações seguintes. "Os próximos materiais
terão que ser melhores que os nossos, que, por sua vez, já são melhores que os materiais-testemunha usados",
explica. "Estamos utilizando o Distrito Federal e o Entorno como nosso padrão. É o melhor mercado do Brasil
para trabalhar com mandioca de mesa. O DF tem o maior consumo per capita e é onde estão os produtores mais profissionalizados",
aponta o pesquisador. A partir daí, a equipe vai ampliar a área de testes, encaminhando os clones para que sejam
avaliados em outras regiões do Brasil por parceiros estratégicos.
A pesquisa participativa
Segundo o pesquisador Eduardo Alano, para que a pesquisa participativa funcione, ela precisa seguir alguns critérios:
material genético para levar para os produtores, interesse dos produtores em testar esses materiais, mecanismo de extensão
rural ágil e eficiente e, também, um financiador que acredite na ideia. "Ou seja, tínhamos todas as condições
para que o trabalho fosse executado de forma eficiente", ressalta.
O estudioso conta como a pesquisa efetivamente ocorreu no campo. "Depois de um trabalho árduo de visita aos produtores
de praticamente todos os núcleos rurais do DF e Entorno, foram selecionados alguns deles para participar do projeto.
Tínhamos que selecionar bons produtores para alcançar o resultado que gostaríamos", lembra o pesquisador.
Para uma boa abrangência no DF, foram escolhidos agricultores de diferentes núcleos rurais e com distintos sistemas
de produção, inclusive orgânico, para que os resultados fossem os melhores possíveis, explica Alano.
Os produtores selecionados tinham a mandioca como carro-chefe da propriedade, ou seja, já se relacionavam com
o mercado, vendendo o produto. Após essa fase inicial, foi feito, em conjunto com os produtores, o plantio das novas
variedades. E, a cada dois meses, os pesquisadores visitavam os locais para acompanhar o desenvolvimento da cultura. "Estávamos
sempre junto com os produtores, assim eles valorizam mais o trabalho. Não é plantar e só voltar para
colher", ressalta. Após a colheita, eram feitas as avaliações finais. Nessa oportunidade, pesquisadores
e produtores se reuniam e os agricultores ranqueavam as variedades, de acordo com a ordem de preferência deles.
Os trabalhos de pesquisa foram conduzidos pela Embrapa Cerrados e Embrapa Recursos Genéticos e Biotecnologia,
em parceria com os produtores rurais, Empresa de Assistência Técnica e Extensão Rural do Distrito Federal
(Emater-DF), Fundação Banco do Brasil e Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico
(CNPq).
Resultados
Para mandiocas amarelas, foram 23 unidades avaliadas em diferentes pontos do DF. O pesquisador salientou a eficiência
do trabalho, pois apenas cinco unidades (20%) foram perdidas, sendo apenas uma por falta de cuidado por parte do produtor
– as outras foram prejudicadas por motivos como excesso de chuva, falta de água e ataque da broca-da-raiz da
mandioca. O destaque entre os agricultores foi a BRS 399, eleita o melhor material em oito das 23 unidades. Nove agricultores
a escolheram como segundo melhor material. "É o nosso campeão de produtividade", aponta.
A cultivar IAC 876-70, conhecida como "Japonesinha", é hoje a variedade mais plantada na região (detém
80% do mercado no DF) e participou da pesquisa como testemunha, obtendo posição intermediária no ranking.
A tabela de probabilidade acumulada de classificação mostra que a BRS 399 ficou entre os quatro primeiros colocados
em 86,96% das avaliações dos produtores, enquanto a IAC 576-70 ficou até o quarto lugar em 30,43% das
vezes.
As vantagens destacadas pelos produtores quanto ao melhor clone foram arquitetura, já que a ramificação
alta facilita o plantio mecanizado e a cobertura do solo; disposição das raízes; cor da polpa mais amarela
que o material encontrado no mercado decorrente de maior teor de carotenoides nas raízes (10,88 µg/gms contra
6,40 µg/gms); produtividade média de raízes de 40,98 toneladas/ha, superando a média nacional e
do DF (16 t/ha), bem como a média obtida com o cultivo da japonesinha (30,30 t/ha); a maior e a menor produtividade
entre os produtores (69,79 t/ha e 16,46 t/ha, respectivamente) foram superiores ao maior e ao menor rendimento obtidos com
a japonesinha (62,55 t e 11,46 t/ha).
Também destaque na classificação dos produtores, a BRS 397 tem arquitetura ainda melhor que a da
BRS 399, retém as folhas mesmo no período seco, com produtividade média de 36,61 t/ha, produtividade
máxima de 78 t/ha e teor de carotenoides nas raízes de 10,7 µg/gms. Já a BRS 396 tem a primeira
ramificação um pouco mais baixa que a BRS 397, raízes mais curtas, com padrão mais comercial;
produtividade média das raízes de 35,84 t/ha e pico de produtividade de 50 t/ha.
"É um material com raízes padronizadas. Deve ganhar espaço na região do DF", aposta Alano.
E o material BRS 398, que se esperava ficar em último lugar na avaliação em razão de apresentar
polpa das raízes creme, chamou a atenção dos produtores que comercializam a mandioca em caixa, em virtude
do padrão comercial das raízes.
Com relação às mandiocas rosadas, foram avaliados oito clones em 13 unidades. Somente cinco dessas
unidades foram perdidas, sendo somente uma em razão da falta de cuidado por parte do produtor. Da mesma forma, foi
feito o ranqueamento dos materiais, revelando dois com potencial: BRS 400, que ficou até a quarta posição
em todas as propriedades, e BRS 401, que ficou até o terceiro lugar em todas as propriedades. "Esse tipo de situação
é importante, pois nos dá mais confiança para recomendar esses materiais", diz o pesquisador.
Apesar de a arquitetura da variedade BRS 400 ter ramificação baixa e necessitar de um bom manejo de espaçamento
para a cobertura de solo, a produtividade média de raízes é elevada (28,58 t/ha), sendo que o topo foi
de 45,79 t/ha. O teor de carotenoides nas raízes foi de 35,37 µg/gms. Já a BRS 401 apresenta arquitetura
melhor, próxima à dos materiais amarelos, com média de produtividade 29,10 t/ha e pico de 59,88 t/ha.
Um pouco mais claro que a BRS 400, apresenta teor de carotenoides de 22,15 µg/gms.
Perspectivas
A equipe de pesquisa agora espera dar continuidade às ações de melhoramento genético, com
a geração e seleção de clones específicos para o bioma Cerrado, e também continuar
o trabalho de melhoramento participativo. Diante da possibilidade de lançamento de mais materiais, será preciso
investir em áreas de multiplicação de clones promissores. Estudos sobre adubação e calagem
devem ser intensificados, bem como sobre irrigação em mandioca de mesa.
A utilização da mandioca na alimentação animal também é uma possibilidade,
principalmente a parte aérea da planta, que não é usada após a colheita, e as raízes, que
não serão comercializadas pelo produtor. "Já fizemos o levantamento da composição nutricional
da parte aérea e das raízes de todos os materiais lançados", explica Alano.
Outra área que já está sendo estudada é a da pós-colheita da mandioca, com agregação
de valor por meio do processamento mínimo de raízes. E são perspectivas de estudo a realização
da análise de processamento da mandioca açucarada para a produção de etanol; o estabelecimento
de parcerias estratégicas para a introdução de clones em outras regiões; e o controle da broca
da mandioca, trabalho recém-iniciado na Embrapa Cerrados com o objetivo de descobrir a época da chegada do inseto
às lavouras e a melhor forma de controle da praga.
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