ONU recomenda estratégias visando igualdade feminina e cita lei brasileira
A ONU recomendou hoje aos governos que incluam estratégias culturais orientadas ao desenvolvimento e à igualdade da mulher, assim como à promoção dos direitos humanos, e comemorou a existência de leis de combate à violência contra o sexo feminino, entre as quais se destaca a brasileira Lei Maria da Penha.
O relatório "Âmbitos de convergência: Cultura, gênero e direitos humanos", de 108 páginas, publicado hoje pelo Fundo das Nações Unidas para a População Mundial (UNFPA) ressalta que a cultura é peça central do desenvolvimento bem-sucedido dos países pobres. Por isto, ela deve ser integrada em suas políticas e programas de desenvolvimento, assim como na assistência humanitária.
Além disso, o texto do relatório destaca que este tipo de estratégias sensíveis aos valores culturais podem reduzir as práticas nocivas contra a mulher e promover os direitos humanos, como a igualdade de gênero e a ampliação dos meios de ação da mulher. No caso da América Latina, por exemplo, as mulheres conseguiram fazer com que "a violência por motivos de gênero seja visível, com o surgimento de leis contra ela, mas o cumprimento prático destas regulações ainda esbarra em problemas", diz o texto.
Entre as medidas citadas pelo relatório destaca-se a Lei Maria da Penha, sancionada no Brasil em 2006 e que homenageia uma biofarmacêutica cearense que lutou durante 20 anos pela condenação do ex-marido, que tentou matá-la duas vezes, sendo que em uma delas a deixou paraplégica.
A lei aumenta o período de detenção nestes casos de violência, permite a prisão preventiva e em flagrante e inclui várias medidas de proteção da mulher, afirma o documento.
Em outros países da América Latina este trabalho se traduziu em leis e acordos como a Convenção Interamericana para Prevenir, Sancionar e Erradicar a Violência contra a Mulher, adotada em 1994 pela Organização dos Estados Americanos (OEA).
No mesmo ano, Argentina e Chile adotaram legislação similar, sendo acompanhados nos anos seguintes por Bolívia, Equador e Panamá. Já em 1996 foi a vez de Colômbia, Costa Rica, El Salvador, Guatemala, Nicarágua, Peru e República Dominicana.
Os especialistas que elaboraram este relatório sobre o estado da população mundial em 2008, ano em que se comemora o 60º aniversário da Declaração Universal dos Direitos Humanos, basearam-se no preceito de que o documento tem validade universal, já que expressa valores comuns a todas as culturas e protege grupos e indivíduos.
O documento também ressalta que "os enfoques com sensibilidade cultural requerem um conhecimento profundo de cada cultura: familiaridade com as maneiras pela qual elas operam e de colaborar com elas".
Sugere alianças, como entre o próprio Fundo e instituições civis de base comunitária, para criar estratégias eficazes que promovam os direitos humanos e coloquem fim a abusos como mutilações, mutilação genital feminina e casamentos infantis.
Neste sentido afirma que "sensibilidade e compromisso cultural não significam aceitar práticas tradicionais nocivas nem dar carta branca para os abusos contra os direitos humanos".
"Apesar das várias declarações e afirmações em apoio aos direitos da mulher, a desigualdade de gênero está generalizada e, em muitas culturas, profundamente arraigada", diz o documento, que adverte que às vezes as próprias mulheres apóiam situações negativas, "acreditando que protegem seus filhos e elas mesmas".
O relatório diz que mulheres e meninas representam três quintos do um bilhão de pessoas mais pobres do mundo.
Também afirma que elas são "dois terços dos 960 milhões de adultos analfabetos do mundo, e as meninas constituem 70% das 130 milhões de crianças que não freqüentam a escola".
"Quando as mulheres são descritas como vítimas e os homens como agressores, não são consideradas as realidades culturais e as várias responsabilidades que a mulher assume em tempos de guerra, como a de chefiar e sustentar a família, e cuidar de seus familiares e combatentes", diz o documento.
Quanto à assistência humanitária em situações de conflito, os analistas da ONU afirmam que devem ser preservados os progressos obtidos pelas mulheres em direção à igualdade de gênero, incluindo a saúde reprodutiva e os direitos reprodutivos.
"A cultura não é um muro que deve ser derrubado. É uma janela para ver, uma porta para abrir e conseguir maiores avanços para o cumprimento dos direitos humanos", afirma na introdução do relatório a diretora-executiva da UNFPA, Thoraya Ahmed Obaid.
Para garantir a proteção dos direitos, a agência da ONU sugere alianças com grupos sociais e lembra que costumam ter sucesso, citando como exemplo o Camboja, onde freiras e monges budistas ocupam um lugar de destaque na luta contra o vírus da aids.
"Para que as alianças tenham sucesso, precisam ser amplas e incluir, por exemplo, organizações de mulheres, de jovens e sindicais, que podem colaborar entre si e se reforçar reciprocamente", disseram os analistas.
Fonte: UOL
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