22/02/2008

Análise

ODM: Metas Mal Compreendidas?

ODM: Metas Mal Compreendidas?

Os Objetivos de Desenvolvimento do Milênio (ODM) celebraram recentemente o seu quinto
aniversário. Estes tiveram um vasto apoio tanto ao nível global quanto ao nível nacional. Todavia, um equívoco comum justifica uma correção da visão convencional sobre os ODM.

Origem – Em 2000, a Cúpula do Milênio sintetizou os objetivos e metas globais, já previamente acordados, num documento denominado ‘Declaração do Milênio’. Os ODM, formulados em 8 objetivos e 18 metas, foram validados pela Assembléia Geral das Nações Unidas no final de 2001.
Eles foram selecionados tendo como base indicadores disponíveis e dados confiáveis que possibilitassem documentar seu progresso.

Os ODM visam reduzir a fome pela metade, a mortalidade infantil em dois terços e a mortalidade materna em três quartos. A questão óbvia é: Por que estas metas são diferentes?; Por que elas não fazem apelo, por exemplo, a uma redução de três quartos como regra geral?

A resposta simplificada é que a maior parte das metas globais são baseadas em tendências históricas. Elas foram estabelecidas a partir do pressuposto de que o progresso observado ao nível global nos últimos 25 anos continuaria durante o próximo período - entre 1990 e 2015. Assim, os ODM eram essencialmente uma extrapolação das tendências globais de 1970 e 1980, projetadas até 2015.

Metas globais versus locais – Assim, medir se o progresso está no bom caminho para o cumprimento dos objetivos em 2015 só pode ser feito a nível global. Os objetivos quantitativos foram definidos de acordo com as tendências globais e não com base nas tendências históricas de uma determinada região ou país. É errado lamentar, por exemplo, que a África Subsaariana não cumprirá os ODM, já que as metas não foram definidas especificamente para esta região.

O espírito da Declaração do Milênio não era impôr um modelo único para as performances dos países, independentemente dos diferentes passados históricos, recursos naturais e desafios específicos. Todavia, é comum interpretar mal os ODM como sendo uma medida uniforme para o desenvolvimento humano. Declarações como ‘55 países não estão no caminho para atingir esta meta’, ou ‘a África Subsaariana só atingirá os objetivos em 2076’, são exemplos deste equívoco.

Não devemos nos surpreender por vários países não atingirem os Objetivos Globais de Desenvolvimento do Milênio, uma vez que estes objetivos não foram definidos para países específicos; pelo contrário, foram baseados em tendências globais. Seria um equívoco trágico dos ODM caso estes países fossem classificados como ‘fracassados’ pela simples razão de não alcançarem números artificiais, baseados em tendências globais passadas.

A má interpretação dos ODM não é um tema puramente acadêmico. O fato de se atribuir o título de ‘mau procedimento’ a um país quando este está fazendo um trabalho perfeitamente respeitável é, sem dúvida, desencorajador. Interpretar os ODM como uma medida uniforme significa condenar inevitavelmente mais da metade dos países à categoria de ‘mau procedimento’, o que prejudicará o apoio político e público para e atingir as metas globais.

Aplicação correta ao nível do país – Antes de afirmar que os ODM são metas ‘facilmente definidas, mas natingíveis’, existem quatro passos práticos que podem ser dados em direção à aplicação correta dos ODM a nível nacional.

1. Os objetivos globais devem ser adequados ao contexto, sendo este um fator essencial à geração de um sentido de pertencimento nacional. Eles visam encorajar os países a empenharem-se em um progresso acelerado. Todavia, a sua aplicação só pode ser julgada face ao que é realmente alcançável, tendo em conta as circunstâncias específicas de cada país. Países que fixem metas nacionais menos ambiciosas que os ODM globais não devem ser estigmatizados. A história mostra que o sucesso na definição das metas depende de um equilíbrio sensato entre ambição e realismo.

2. Metas intermediárias são essenciais para manter um comprometimento político e assegurar a
responsabilidade. Os ODM devem estar ligados às agendas políticas dos atuais governos. É improvável que os objetivos de longo prazo, por eles mesmos, sejam capazes de modular as reformas políticas e os planos de ação atuais, já que os prazos finais estão demasiadamente longe, no futuro.

3. Propostas concretizáveis e reformas devem ser formuladas de forma a acompanhar o progresso, visando sempre os objetivos acordados de longo prazo. Estas devem ir desde a imunização das crianças à ionização do sal, da formação de professores à construção de escolas, passando pelo tratamento de pacientes infectados com Aids, redes de distribuição de leitos, reforço de leis contra a discriminação de gênero, abolição de taxas para a educação primária e para o sistema básico saúde, fortalecimento do sistema fiscal progressivo e da realocação dos gastos em prol dos pobres.

4. Estimar o custo destas ações e reformas deve fazer parte do orçamento nacional. O orçamento nacional deve refletir de forma adequada as metas finais e intermediárias definidas nos passos 1 e 2 – uma ligação muitas vezes perdida na prática. Todavia, seria errado aconselhar uma estimativa dos custos dos ODM em um período extenso de tempo.1 Os custos dos ODM só produzirão resultados, com um certo nível de precisão, quando estimados dentro de um período de 2 a 3 anos.

Em suma, as metas globais têm o seu contexto e nele devem ser mantidas. Se os ODM continuarem a ser interpretados como um modelo único, pode suceder-se um grande silêncio, à medida em que o prazo de 2015 estiver mais próximo.

Fonte: Centro Internacional de Pobreza

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