Depois de cancelarem planos por causa da crise, exportadores planejam investimento recorde de US$
122 bilhões, revela BNDES
Raquel Landim
Os setores exportadores estão desengavetando seus
projetos bilionários de investimento. Mineradoras, siderúrgicas e fabricantes de papel e celulose vão
gastar US$ 122 bilhões entre 2010 e 2013 para ampliar a produção, revela estudo inédito do Banco
Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES).
O valor está 50% acima dos US$ 81 bilhões
que, em agosto de 2009, essas empresas previam investir entre 2009 e 2012. A crise global levou setores que exportam a maior
parte da produção a adiar e até cancelar projetos de investimentos, que somavam o recorde de US$ 145
bilhões em agosto de 2008.
O Brasil se recuperou rápido da turbulência. No terceiro trimestre de
2009, empresas focadas no mercado interno voltavam a investir, mas as perspectivas eram negativas fora do País. Ainda
persistem dúvidas, principalmente na Europa, mas o inicio da recuperação, puxada pelos países
emergentes, garantiu fôlego novo aos exportadores.
"Na crise, exportadores reduziram a produção
e chegaram a investir menos que o necessário para manter a fábrica funcionando bem. A ordem era fazer caixa
para não depender de crédito", diz o chefe do departamento econômico do BNDES, Fernando Puga. "Em meados
de 2009, retomaram a produção. Este ano, todos os investimentos estão voltando com força."
Preços
em alta. O apetite da China sustenta os preços das commodities exportadas pelo Brasil. Os preços do minério
de ferro foram reajustados em 100% - algo impensável poucos meses atrás. A tonelada de celulose chegou a US$
770 em abril, bem acima dos US$ 540 de agosto de 2009, embora abaixo dos US$ 840 de antes da crise.
A Vale anunciou
que vai investir US$ 12,9 bilhões este ano, o maior valor entre as mineradoras internacionais. A empresa tinha sido
duramente atingida pela crise: reduziu os investimentos previstos para 2009 de US$ 14,2 bilhões para US$ 9 bilhões.
Segundo
o Instituto Brasileiro de Mineração (Ibram), os investimentos totais do setor, entre 2010 e 2014, chegarão
a US$ 54 bilhões. No auge da crise, a previsão era de US$ 47 bilhões. "Antes acreditávamos que
só retomaríamos o patamar pré-crise em 2012. Agora vai ocorrer em 2011", disse o presidente do Ibram,
Paulo Camilo.
A Samarco planeja construir uma nova usina de pelotização de minério, orçada
em R$ 5 bilhões. Se tudo correr bem, as obras começam em dezembro. "Estamos trabalhando forte na retomada dos
investimentos", disse o diretor de desenvolvimento e planejamento, Paulo Rabelo. Quando a crise atingiu os mercados, a empresa
chegou a parar plantas industriais.
Triplicou. O estudo do BNDES aponta que as perspectivas de investimento duplicaram
no setor siderúrgico e triplicaram nas fábricas de papel e celulose desde a crise. As siderúrgicas vão
aumentar a produção das atuais 42 milhões de toneladas para 77 milhões de toneladas até
2016, conforme o Instituto Aço Brasil.
"Boa parte desse volume é para exportação", disse
Marco Polo de Mello Lopes, presidente-executivo. As siderúrgicas desligaram seis dos 14 alto-fornos na crise. Hoje
a produção está quase normalizada, graças à retomada do mercado interno.
Mesmo em
setores exportadores, o desempenho do Brasil foi fundamental para a retomada dos investimentos. "As vendas internas absorveram
uma parte do que era exportado. Agora, para voltar a exportar, as empresas têm de produzir mais", diz Fábio Silveira,
economista da RC Consultores. "Somadas, as demandas doméstica e externa já são maiores que antes da crise."
É
o caso da fabricante de embalagens e papel Klabin. "Saímos da crise com a demanda maior que a capacidade de produção",
disse o diretor-geral Reinoldo Poernbacher. O volume vendido no primeiro trimestre superou em 20% o primeiro trimestre de
2008, antes da crise. A Klabin pode se dar ao luxo de escolher clientes. "O mercado que estamos dando menos atenção
é a Europa. Os destaques são China e América Latina."
A Klabin elevou em 10% a oferta de papelão
ondulado e de sacos industriais com investimentos não previstos no orçamento, e está em vias de aprovar
a compra de uma máquina para incrementar a produção de cartão para embalagem em 400 mil toneladas.
"É só nisso que pensamos de hora em hora", disse Poernbacher. A decisão ainda não foi tomada por
causa do câmbio.
Segundo a presidente-executiva da Associação Brasileira de Papel e Celulose (Bracelpa),
Elizabeth Carvalhaes, a receita do setor ainda não voltou ao nível pré-crise, apesar da recuperação
dos preços internacionais, porque o real valorizado prejudica a rentabilidade das exportações.
Empresas
do setor de papel e celulose enfrentaram muitos problemas na crise. Aracruz e Votorantim perderam dinheiro com derivativos
cambiais e se uniram na Fibria. A nova empresa não pode investir sem liquidar os empréstimos feitos para sair
do sufoco. Mas tudo indica que o momento está próximo.
A concorrente Suzano entrou na crise com R$ 2
bilhões em caixa. Por isso, não interrompeu os investimentos na construção de duas novas fábricas.
"Temos convicção de que o cenário de oferta e demanda é positivo no futuro", disse o diretor de
relações com investidores, André Dorf.
Para Sérgio Vale, economista da MB Associados, o
momento é bom para investir, porque as taxas de juros mundiais estão baixas e os investidores buscam oportunidades
fora dos países ricos. "É um momento único porque os emergentes passaram a ser vistos com outros olhos."
Fonte: O Estado de S. Paulo, 16/05/2010