Empresários temem complexidade do eSocial
Novo sistema de prestação de contas com a Receita pode burocratizar e aumentar custos das empresas
O Sistema de Escrituração Fiscal Digital das Obrigações Fiscais, Previdenciárias e Trabalhistas,
batizado como eSocial, só passa a ser obrigatório a partir de janeiro do ano que vem, mas já preocupa
empresários. O temor está ligado ao aumento de custos e de burocracia na transmissão das informações
que devem ser prestadas à Receita Federal. A ironia é que o sistema foi criado exatamente para simplificar o
processo e evitar sonegação.
O novo modelo é mais um projeto do Sistema Público de Escrituração Digital (SPED), instituído
em 2007. Ele estabelece o envio de forma digital, por parte das empresas, das informações cadastrais de todos
os empregados. O sistema vai substituir o envio de nove obrigações que hoje são feitas mensal e anualmente
— como o Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged) e a Declaração de Imposto de Renda Retido
na Fonte (Dirf)—por apenas um envio.
Só que, além dessas informações já tradicionais, o Ato Declaratório nº
5 da Receita estabelece que todas as empresas terão que enviar—em alguns casos diariamente — o histórico
dos empregados, com informações que vão desde a admissão até a demissão, passando
pelos atestados médicos e as advertências. Ao todo, as empresas terão que enviar à Receita Federal
44 tipos de informações por empregado. “Da forma que está desenhado na fase atual, o projeto acaba
por criar obrigações desmedidas às empresas, gerando maior burocracia e custo”, diz o diretor-adjunto
sindical da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp), Adauto Duarte.
A Fiesp pretende encaminhar ao governo documento sugerindo alterações nessa que é a primeira versão
do eSocial. “Por cautela, vamos sugerir que o governo entre com o sistema conforme previsto apenas unificando as informações
que já são repassadas e depois, através do diálogo tripartite, se construam as novas obrigações”,
comenta Duarte.
Entre os novos custos para as empresas, o diretor cita o alto valor de atualização dos sistemas informáticos
de folha salarial, que terão que ser compatíveis com o eSocial, e o investimento no treinamento dos empregados.
“Além disso, no início haverá a convivência dos vários sistemas, como por exemplo
o eSocial e o Caged. “Nesse período de transição, as empresas terão que arcar com o custo
do envio de informações em duplicidade.”
SAIBA MAIS:
Sua empresa está preparada para o eSocial?
O Decreto nº 6.022, de 22 de janeiro de 2007, instituiu o Sistema Público de Escrituração Digital
(Sped), no início voltado para a área tributária, por meio do qual as empresas passaram a ter a obrigação
de fornecer, de forma digital e unificada, todas as informações contábeis e fiscais que anteriormente
eram objeto de diversos programas, livros e formulários apartados.
Inicialmente conhecido como EFD-Social, o agora chamado E-Social trata-se de um módulo do SPED, definido como
a Escrituração Digital das Obrigações Fiscais, Previdenciárias e Trabalhistas.
A partir da implantação, para as empresas em geral, terão acesso ao sistema a Secretaria da Receita
Federal, o Ministério do Trabalho e Emprego (MTE), o INSS, a Caixa Econômica Federal, o Conselho Curador do FGTS
e aJustiça do Trabalho, em especial no módulo relativo ao tratamento das reclamações trabalhistas.
Os riscos de aplicação de multas, pedidos de indenização por dano moral por doença
profissional e outras, tendem a aumentar
Em 17 de julho deste ano, por meio do Ato Declaratório Executivo Sufis nº 5, foram disponibilizados os primeiros
layouts do sistema, os quais, pela ampla gama de informações requeridas e sua complexidade, além da possibilidade
de reflexos negativos para as empresas, têm gerado inúmeras discussões, inclusive quanto à legalidade
de suas exigências.
Há ainda, informações de cunho subjetivo. Por exemplo, sobre a aquisição de casa própria
pelo empregado com o uso dos recursos do FGTS, dado que a empresa não detém e terá de obter do trabalhador,
podendo ser entendida como invasão da privacidade.
Também não tem base legal a indicação de riscos ergonômicos e mecânicos/acidentes
dentre os riscos ambientais a que o empregado está exposto, que servirão para compor o seu PPP (Perfil Profissiográfico
Previdenciário). Isto porque, a legislação somente considera agentes nocivos os riscos químicos,
físicos e biológicos previstos no Anexo IV do Decreto 3.048/99 - Regulamento da Previdência Social. Assim,
é defensável dizer que as empresas não estão obrigadas a informá-las ao Esocial.
Existe, ainda, a previsão de emissão de CAT (Comunicação de Acidente de Trabalho) para trabalhador
não empregado, o que não se sustenta legalmente.
Sobre os Atestados de Saúde Ocupacional (ASOs), a Norma Regulamentadora nº 7 do MTE exige apenas a indicação
no documento se o empregado encontra-se apto ou inapto ao trabalho. Já os layouts disponibilizados pela Receita Federal
trazem opções que não encontram embasamento na referida norma.
As empresas estarão obrigadas, ainda, a lançar todas as horas extras do empregado e, caso haja extrapolação
habitual do limite legal de duas horas diárias, pode haver interpretação equivocada por parte da fiscalização,
de que os empregados estão sendo submetidos a jornadas exaustivas, as quais, no conceito subjetivo do MTE, podem dar
margem à interpretação equivocada acerca de condição degradante de trabalho, gerando inúmeras
consequências negativas às empresas.
Haverá também a obrigatoriedade de se lançar todos os atestados médicos apresentados pelo
empregado, com previsão de afastamento do trabalho, ainda que por menos de um dia, o que vai gerar excessiva burocracia.
E, caso a folha de pagamento já tenha sido emitida, deverá ser refeita e reencaminhada.
O assunto ainda é muito incipiente, e gera muitas dúvidas e discussões. Tanto que a Receita Federal
está em vias de aumentar os prazos para a entrada em vigor do sistema conforme a modalidade em que as empresas se enquadram.
Assim, as empresas tributadas pelo Lucro Real devem se cadastrar a partir de abril de 2014; as MEI e Pequeno Produtor
Rural terão a implantação com recolhimento unificado no final do primeiro semestre de 2014; e as empresas
Tributadas pelo Lucro Presumido e componentes do Simples, devem se cadastrar a partir de setembro de 2014.
Considerando que o acesso às informações prestadas será de conhecimento de diversas autoridades,
os riscos de aplicação de multas administrativas, reclamações trabalhistas com pedido de indenização
por dano moral em decorrência de doença profissional e outras, tende a aumentar. As empresas, em primeiro lugar,
devem zelar por um ambiente de trabalho saudável e seguro, aprimorando os procedimentos internos, por meio de auditorias
internas, a fim de atender integralmente à legislação trabalhista e normas regulamentadoras do MTE.
É certo, ainda, que as informações prestadas devem ser coerentes e embasadas em documentos que possam
contribuir com a defesa da empresa, caso necessário.
Por fim, embora o módulo ESocial seja uma boa ferramenta para unificação das informações
e eliminação de formulários de papel, as empresas devem estar atentas aos informes que serão neles
inseridos, treinando e orientando o pessoal responsável pelo preenchimento dos formulários, a fim de se evitar
dados desencontrados, bem como riscos trabalhistas e de autuações, tanto por parte do MTE, quanto do INSS e
da Receita Federal.
Cibele Paula Corredor é advogada do Mesquita Barros Advogados, pós-graduada em direito previdenciário
pela Escola Paulista de Direito (EPD)
Este artigo reflete as opiniões do autor, e não do jornal Valor Econômico. O jornal não se
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Publicado em 21/10/2013 no Valor Econômico. Por Cibele Paula Corredor.