e receba nosso informativo
Publicado em 28/09/2017
Fonte: Valor Econômico
Uma nova disputa já se desenha na Esplanada dos Ministérios e deve acirrar posições divergentes no governo: o que fazer com um parecer recém-concluído pela área técnica, em caráter final, com a recomendação expressa de impor sobretaxa ao aço chinês.
O parecer da Secretaria de Comércio Exterior (Secex), ainda confidencial, indica que fornecedores de laminados a quente da China e da Rússia vendem seus produtos no mercado brasileiro a preços desleais. Por isso, defende a aplicação de direito antidumping contra siderúrgicas dos dois países. A deflagração de um contencioso com Pequim, atualmente o maior parceiro comercial do Brasil, preocupa as autoridades.
De um lado está o Instituto Aço Brasil, influente entidade do setor, que reúne as três empresas autoras da investigação: ArcelorMittal, Companhia Siderúrgica Nacional (CSN) e Gerdau Açominas.
De outro lado, 18 associações industriais - como Anfavea, ABIMAQ, Eletros e Sinaval - enviaram carta ao presidente Michel Temer contra a sobretaxa. Elas alegam que haverá um "inevitável repasse de preço" pelos fornecedores nacionais em caso de encarecimento do produto importado e alertam sobre o risco de "pressão inflacionária e aumento de preço ao consumidor final, além do impacto à competitividade das nossas exportações".
Uma reunião do conselho de ministros da Câmara de Comércio Exterior (Camex), com esse assunto na pauta, acaba de ser convocada para o dia 25 de outubro. Antes disso, o Gecex - grupo composto pelos secretários-executivos de cada pasta integrante do colegiado - tem encontro marcado no dia 11, mas ninguém acredita que uma decisão tão sensível dos pontos de vista comercial e político possa sair sem o aval direto dos ministros.
O Ministério da Indústria, Comércio Exterior e Serviços (MDIC) tem mantido postura a favor da aplicação de direitos antidumping e tudo aponta para uma defesa do trabalho de seus técnicos na Secex. O parecer é descrito por seus conhecedores como "extenso e minucioso", um dos mais abrangentes já produzidos pelo departamento de defesa comercial, justamente como forma de se antecipar a eventuais críticas.
Em abril, a resolução nº 29 da Camex - publicada dias antes de sua saída do Itamaraty e transferência de volta para o MDIC - regulamentou como recomendações finais da área técnica podem ser ignoradas em casos de "interesse público" nas medidas antidumping ou de direitos compensatórios a práticas desleais de comércio. Mesmo havendo provas de que os chineses e russos inundaram o mercado brasileiro com aço artificialmente barato, esse princípio pode ser evocado como forma de negar a sobretaxa.
O caso dos laminados a quente ainda não foi discutido em profundidade pelos ministérios envolvidos na Camex. Em discussões recentes e sinalizações preliminares, no entanto, há um embate em gestação. Fazenda e Secretaria de Assuntos Estratégicos - esta última subordinada ao ministro Moreira Franco - têm sido bastante críticas das ações antidumping. Elas recorrem não só ao argumento de impacto nos custos das cadeias produtivas, mas a estudos mencionando que setores mais protegidos da economia são menos competitivos.
Em julho, o Brasil importou 137 mil toneladas de laminados planos, ou 14,1% do consumo no mês. Um ano antes, essa penetração era de 4,4%. A China é um dos maiores fornecedores externos.
O Ministério da Agricultura, que também tem assento no colegiado, costuma olhar interesses setoriais nas discussões. Algumas recentes medidas protecionistas tomadas pela China, como a abertura de investigação antidumping contra a carne de frango do Brasil, são tidas nos bastidores como possível retaliação ao caso dos laminados a quente.
O Itamaraty, frequente protagonista nas reuniões da Camex, tem uma visão mais universal e obrigatoriamente presta atenção nas relações bilaterais como um todo. E o que está em jogo não é pouca coisa. Investidora pesada no setor elétrico e com um fundo de US$ 20 bilhões que pode financiar grandes projetos de infraestrutura, a China tem mostrado claramente disposição em aprofundar sua parceria com o Brasil na gestão do presidente Michel Temer, que foi recebido em visita de Estado a Pequim.
Os asiáticos têm cobrado insistentemente o reconhecimento do status de economia de mercado por seus principais parceiros, incluindo o Brasil, a partir de dezembro de 2016 - 15 anos após sua entrada na Organização Mundial do Comércio (OMC). Esse período serviu, em tese, justamente para se adaptar às regras internacionais. Estados Unidos, Japão e União Europeia dizem que não têm como dar esse status à China por causa da forte intervenção estatal e dos enormes subsídios para suas empresas.
Envie para um amigo