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Publicado em 04/09/2017
Fonte: Agência de notícias da CNI
Além de harmonizar as relações do trabalho e reduzir conflitos judiciais, a nova legislação trabalhista deve contribuir para o aumento da formalidade no mercado de trabalho brasileiro. Segundo José Márcio Camargo, professor do Departamento de Economia da Pontifícia Universidade Católica (PUC) do Rio de Janeiro, a Lei nº 13.467/2017 contempla formas de contrato que contribuirão para levar a proteção da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) a quem está à margem da lei. “Entre os 20% mais pobres, a taxa de desemprego é de 23%, e 60,6% dos empregos estão na informalidade”, disse.
A razão, segundo ele, é de que, em geral, “os trabalhadores mais pobres são menos qualificados e estão em ocupações intermitentes, cuja demanda existe num determinado momento e não existe em outro”. Para Camargo, outro ponto positivo da lei é que ela aproxima as normas brasileiras às praticadas em países desenvolvidos. “Esta é uma legislação muito melhor do que a da maior parte dos países europeus, é melhor do que de países da América Latina”, avaliou, em entrevista à Agência CNI de Notícias. A nova lei entra em vigor em novembro. Confira a entrevista:
AGÊNCIA CNI DE NOTÍCIAS – Uma das críticas feitas à aprovação da
lei que moderniza as leis do trabalho é de que não houve debate com a sociedade. O senhor concorda?
JOSÉ MÁRCIO CAMARGO – A ideia de que essa lei foi feita de supetão, com pouca discussão, é totalmente equivocada. Existe uma discussão sobre a reforma da CLT (Consolidação das Leis do Trabalho) desde a década de 1980. Já são 40 anos que estamos discutindo, publicando artigos, debatendo na imprensa e em seminários a necessidade de atualizar a lei. Tanto que houve mudanças, ainda que pequenas, no governo de Fernando Henrique (Cardoso) e no governo Lula. Então, dizer que essa reforma foi feita de supetão, de forma autoritária, é um equívoco total.
AGÊNCIA CNI DE NOTÍCIAS – De que formas essa nova legislação poderá contribuir para harmonizar as relações do trabalho no Brasil?
JOSÉ MÁRCIO CAMARGO – O primeiro aspecto importante é que os contratos vão passar a valer e a não ficar sob a interferência da Justiça do Trabalho. Hoje os contratos, praticamente, não valem nada, no sentido de que, quando se encerra um vínculo, o contrato é totalmente renegociado. Ou seja, aquilo que foi negociado no começo, não valeu nada. Isso gera uma enorme incerteza jurídica, que é o maior problema da relação de trabalho e que acaba contaminando as relações pessoais no Brasil.
AGÊNCIA CNI DE NOTÍCIAS – Como assim?
JOSÉ MÁRCIO CAMARGO – Isso criou uma relação totalmente oportunista entre patrões e empregados, o que vai acabar. O juiz não vai poder interferir em vários itens da CLT, que hoje, em geral, são demandados na Justiça do Trabalho, porque está claro no contrato (individual e em acordos e convenções coletivos) e o que está no contrato vai passar a valer. Vamos ter, a partir de agora, uma cultura de se cumprir contratos.
AGÊNCIA CNI DE NOTÍCIAS – Ao deixar claro o que pode e não pode ser negociado, como a nova lei contribuirá para o dia a dia de empresas e trabalhadores?
JOSÉ MÁRCIO CAMARGO – Ao se permitir que possa adaptar a lógica do trabalho às condições efetivas vai gerar ganho enorme de produtividade. Se empresa e trabalhador concordarem que é melhor trabalhar seis horas por dia e ir para casa por razões específicas, isso vai valer. E os ganhos de produtividade serão incorporados de alguma forma aos salários e aos lucros da empresa. Esse é um ponto importante: poder negociar para se adaptar os contratos coletivos às caraterísticas da ocupação é absolutamente fundamental e que era impossível de se fazer sem se correr algum risco de um juiz interpretar o negociado como uma violação à legislação.
AGÊNCIA CNI DE NOTÍCIAS – A CLT havia ficado desatualizada em relação à evolução às formas de trabalho comuns nos dias de hoje?
JOSÉ MÁRCIO CAMARGO – Há tipos de ocupações e de empregos que não são contemplados pela CLT. Fica extremamente caro. Se uma empresa precisa de um trabalhador para o fim de semana, não pode contratar. Se precisar de um trabalhador para duas por dia, corre-se o risco de a Justiça do Trabalho te penalizar porque só se admite por cinco horas por dia, que é o contrato em tempo parcial. Agora isso será possível. Em vez de deixar o trabalho informal e arriscar um multa da fiscalização do trabalho, vai compensar fazer um contrato formal, pagando os direitos trabalhistas.
AGÊNCIA CNI DE NOTÍCIAS – Que impacto essa desatualização tem sobre o mercado de trabalho brasileiro?
JOSÉ MÁRCIO CAMARGO – Se olharmos os dados de renda e de mercado de trabalho, entre os 20% mais pobres, a taxa de desemprego é de 23%. E 60,6% dos empregos estão na informalidade. A CLT, na verdade, é uma legislação que está voltada para os trabalhadores mais ricos, para os 20% mais ricos. A razão para isso é simples. Em geral, os trabalhadores mais pobres são menos qualificados, estão em ocupações intermitentes, cuja demanda existe num determinado momento e não existe em outro. Isso é particularmente verdade em comércio e serviços, na construção civil e em alguns setores da indústria.
AGÊNCIA CNI DE NOTÍCIAS – Historicamente, mesmo nos ciclos de expansão da economia, a informalidade sempre esteve na casa de 40% da força de trabalho. Como a nova lei pode melhorar esse quadro?
JOSÉ MÁRCIO CAMARGO – A CLT não tem um contrato por hora, só tem contrato por jornada, embora esse tipo de trabalho sempre ter existido. Por isso a CLT expulsa os trabalhadores pobres. Agora vai se ter o contrato de trabalho intermitente, que poderá por um número de dias e um número de horas, pagando-se os encargos pelo tempo trabalhado. Agora vai ficar mais barato contratar um trabalhador no contrato intermitente do que deixá-lo informal. Significa que vamos ter uma diminuição importante na informalidade e no desemprego, porque vai ficar mais barato contratar trabalhadores para algumas atividades produtivas.
AGÊNCIA CNI DE NOTÍCIAS – O senhor acredita que o Brasil contará com uma legislação trabalhista mais compatível com a praticada nos países com os quais competimos?
JOSÉ MÁRCIO CAMARGO – Sem a menor dúvida. Esta é uma legislação muito melhor do que a da maior parte dos países europeus, é melhor do que de países da América Latina. Ela se aproxima das legislações que são de aplicação mais simples.
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