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Publicado em 02/03/2017
Fonte: Ipesi
A política econômica adotada pelo governo do presidente Michel Temer não agrada a indústria brasileira. Em 23 de fevereiro, a Confederação Nacional da Indústria (CNI) divulgou nota técnica, alertando o governo sobre os efeitos da valorização do real na competitividade das empresas e no emprego. No mesmo dia, a Agência Brasileira de Desenvolvimento Industrial (ABDI) divulgou uma análise em que lembra que a redução na taxa básica de juros é importante sim, mas que por si só não resolve o problema de competitividade e de retomada do crescimento sustentável.
"Cabe destacar que, o aumento do investimento não depende apenas da redução da taxa de juros, mas de outras variáveis macroeconômicas relevantes, como o câmbio, que nos últimos meses apresentou valorização frente ao dólar e pode desviar parte do provável aumento do consumo para as importações", diz a análise da ABDI, tocando no mesmo ponto da nota técnica da CNI.
De acordo com a nota técnica da CNI, a taxa de câmbio real/dólar caiu 17% ao se comparar a média mensal de janeiro e dezembro de 2016. Somente nos dois primeiros meses de 2017, houve uma queda adicional de 7,2%, totalizando 23% em um espaço de 14 meses.
"Essa forte mudança no preço da moeda estrangeira pode causar danos irreparáveis nas estratégias das empresas e no investimento. Como as operações de comércio exterior têm prazos longos, negócios de exportação realizados há seis meses, com uma determinada taxa de câmbio, tem seu fechamento financeiro afetado quando a taxa de câmbio sofre valorização brusca e excessiva, consubstanciando-se muitas vezes em prejuízo", frisa a CNI.
Para a CNI, o nível da taxa de câmbio é uma variável fundamental no processo de desenvolvimento econômico, pois alterações na taxa de câmbio podem provocar importantes efeitos sobre a estrutura produtiva e de emprego do país. Seu comportamento reflete diretamente na competitividade da indústria, pois sua valorização torna os produtos estrangeiros mais competitivos frente aos nacionais, seja no mercado doméstico, seja no exterior.
"Ao tornar os bens importados mais baratos, sobrevalorizações cambiais excessivas e prolongadas reduzem a lucratividade da produção e do investimento em setores de bens comercializáveis (que são transacionados internacionalmente). Ao mesmo tempo, o preço de não-comercializáveis fica artificialmente mais elevado. Como setores de bens comercializáveis são, tradicionalmente, setores que tendem a ter maior capacidade inovadora, maior agregação de valor e maior nível de produtividade, a valorização provoca a transferência de mão-de-obra de setores de baixa produtividade para os de alta produtividade, com impacto negativo no nível de produtividade geral da economia", observa a CNI.
A CNI destaca ainda que além da valorização do real, a volatilidade também é problema, já que a instabilidade dificulta a formação de preços, as decisões de investimento e de produção das empresas industriais.
A confederação diz que no curto prazo, é indispensável adotar mecanismos que evitem a valorização permanente da moeda brasileira, que retira a competitividade dos produtos brasileiros, tanto no mercado brasileiro como no mercado global, bem como suas oscilações excessivas. "É difícil alterar a tendência dos movimentos cambiais globais. Todavia, é possível atuar para evitar flutuações excessivas na taxa de câmbio originadas do mercado doméstico e mundial e, principalmente, coordenar as políticas domésticas para minimizar os efeitos indesejados sobre a taxa de câmbio", frisa.
Segundo a CNI, a vigência de uma política monetária muito restritiva, em função da permanência de déficits fiscais elevados, provoca a ocorrência de taxas de juros brasileiras muito acima das taxas internacionais. O diferencial de juros atrai recursos externos que fomentam uma valorização da moeda brasileira não fundamentada nos fatores reais de custo e competitividade. A convergência da inflação para a meta permite, e justifica, a redução desse diferencial, com queda mais pronunciada dos juros domésticos.
"É, portanto, fundamental que os formuladores de política tenham em mente os efeitos da valorização cambial não só na inflação como no restante da economia, em especial na indústria", diz a CNI, acrescentando que reconhece que os problemas de competitividade não se resumem à taxa de câmbio. "As reformas microeconômicas voltadas para o aumento da competitividade são igualmente fundamentais e a CNI espera que essa agenda receba máxima prioridade", encerra.
TAXA DE JUROS - A ABDI, para quem não a conhece, está sob a supervisão do Ministério da Indústria, Comércio Exterior e Serviços, e é a única agência de inteligência do governo federal para o setor produtivo. Para a ABDI, o anúncio da queda da taxa de juros para 12,25% a.a, feito no dia 22 pelo Banco Central, representa uma boa notícia para o setor produtivo brasileiro, sobretudo com uma expectativa de continuidade de queda até o final do ano, chegando, pelas previsões do mercado, em torno de 9% a.a.
De acordo com a análise da ABDI, em um primeiro momento, uma redução da taxa de juros pode incentivar o aumento do consumo e influenciar a confiança do empresário e o nível de investimento no setor produtivo. Porém, para que isso seja de fato concretizado, é necessário sinalizar que essa redução da taxa de juros básica da economia continuará nos próximos meses, como o Banco Central tem divulgado em suas atas
Segundo a ABDI, a redução da taxa de juros não resolve o problema de competitividade e de retomada do crescimento sustentável. Ela sinaliza um potencial de crescimento do investimento, mas deve ser acompanhada de uma visão estratégica por parte do setor produtivo e do setor público.
"O que devemos buscar é um aumento dos investimentos que represente efetivamente um salto de qualidade na economia brasileira. Isso ocorrerá se tivermos, por um lado, uma melhoria da infraestrutura nacional e, por outro, a 'reestruturação' do setor produtivo para enfrentar os desafios de competitividade que virão, como o surgimento de novos tipos de indústrias e a realização de políticas agressivas pelos principais países parceiros. É necessário, portanto, que o aumento dos investimentos no Brasil foque no surgimento de uma "nova" indústria, que incorpore de forma mais ativa inovações e capaz de agregar valor", diz a análise. E continua: "Isso é fundamental, uma vez que, ao redor do mundo, a emergência da indústria 4.0 e da manufatura avançada faz com que indústrias tradicionais, que utilizavam velhos métodos, tornem-se defasadas e percam competitividade e mercado."
A ABDI acredita que para enfrentar estes desafios é necessário escolher um caminho para o país "e essa escolha passa por uma indústria forte intimamente vinculada a um setor de serviços moderno".
"Em outras palavras, temos que "reindustrializar" o Brasil em novos moldes, construir canais para a integração sinérgica entre produção de bens e forte agregação/incorporação de valor aos produtos por meio de serviços industriais sofisticados - engenharia, design e software. O setor produtivo brasileiro precisa alcançar a "revolução" industrial em andamento", diz a ABDI.
Para a ABDI, é importante estabelecer estratégias, indo além da redução da taxa de juros. "Isso permitirá ao setor produtivo ocupar nichos, ganhando, então, oportunidades para ampliar sua capacidade produtiva, gerar renda e emprego de qualidade, e, ao mesmo tempo, competir com os produtos trocados no comércio internacional. De outro modo, precisamos nos estabelecer naqueles negócios em que somos bons, naqueles que podemos melhorar ou naqueles que temos potencial, sermos agressivos para ocuparmos espaço no mercado global e, assim, abocanharmos uma parte das vendas que estão à procura de fornecedores no mundo. Isso oportunizará às nossas empresas novos mercados, horizonte de planejamento e estímulo para ampliar investimentos em capacidade e em P&D. São essas variáveis que darão ao Brasil competitividade para produzir, vender e gerar emprego e renda dentro do país", encerra.
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