Microalgas decompõem dejetos suínos e geram biodiesel
Publicado em 26/05/2015
É provável que em breve plantas invisíveis ao olho humano provoquem mudanças importantes
na suinocultura brasileira. Estudos da Embrapa Suínos e Aves (SC) comprovaram que microalgas podem ser utilizadas com
grande eficiência no tratamento dos dejetos suínos e na geração de biogás. Em um horizonte
um pouco mais amplo, serão também matéria-prima de qualidade para produção de rações
para uso animal, biocombustíveis e até produtos fármacos e cosméticos.
As microalgas
são unicelulares e crescem em água doce ou salgada. Como seu próprio nome diz, são muito pequenas.
Tão pequenas que seu tamanho é medido em micrômetros (um micrômetro equivale à milésima
parte do milímetro). A estimativa é de que existam cerca de 800 mil espécies de microalgas no mundo.
O centro de pesquisa da Embrapa analisa o uso de microalgas no tratamento de dejetos suínos desde meados dos
anos 1990. A observação das microalgas que naturalmente surgem nas lagoas instaladas na sequência de biodigestores
existentes em propriedades rurais no Oeste de Santa Catarina fez com que os pesquisadores da Embrapa optassem por um caminho
em especial.
Limpeza com geração de gás
"Hoje, estamos seguros de que as microalgas podem ser usadas para remover os nutrientes nos efluentes de dejetos
de suínos. Além de limpar a água, elas podem ser colocadas, por exemplo, no interior do biodigestor para
aumentar a capacidade de geração de biogás", explica o pesquisador Marcio Busi da Silva.
A proposta da Embrapa, que trabalha em parceria com instituições como a Universidade Estadual de Santa
Catarina (Udesc) e a Universidade do Oeste de Santa Catarina (Unoesc), pode fazer de um problema histórico uma solução
promissora. Os dejetos suínos foram vistos nas últimas três décadas como forte ameaça ambiental
nas regiões que concentram a produção.
Como as microalgas se alimentam justamente dos
nutrientes presentes nos dejetos, elas têm a capacidade de tornar mais eficientes os sistemas de tratamento instalados
no campo. Mas esse não é o principal ganho. De acordo com o pesquisador, o que deve revolucionar a forma como
os dejetos suínos são vistos é o uso posterior da biomassa de microalgas, gerada a partir dos resíduos
da produção. Biomassa é todo recurso originado de matéria orgânica capaz de produzir energia.
No modelo já testado em laboratório pela Embrapa e facilmente aplicável à realidade da suinocultura
nacional, as microalgas são recolhidas e inseridas novamente no biodigestor, aumentando significativamente a geração
de biogás. Assim, é possível produzir energia elétrica ou gás em maior volume e constância.
"Só essa melhoria já teria um impacto importante, especialmente no Sul do Brasil, em que há uma pressão
ambiental maior sobre a atividade", destaca Marcio Busi.
Se o interesse despertado entre empreendedores do País pode ser usado como um termômetro, é quase
certo que as microalgas tendem realmente a ocupar um espaço importante no mundo da suinocultura nos próximos
anos. Neste momento existem cerca de dez empresas no País tentando viabilizar negócios que têm as microalgas
como elemento central. Uma delas é a Séston Biotecnologia, que trabalha em parceria com a Embrapa Suínos
e Aves. Para o sócio da empresa e professor da Udesc, Fábio de Farias Neves, o negócio de transformação
das microalgas em vários produtos está quase no ponto de sair dos laboratórios para o campo no Brasil.
No caso da Séston, serão colocados no mercado cosméticos e itens de nutrição animal.
Outro esforço da Embrapa volta-se para a formação de um banco de germoplasma com as espécies
de microalgas existentes no Brasil. A Embrapa Agroenergia e a Embrapa Suínos e Aves atuam em conjunto nesse objetivo,
liderado pelo pesquisador Bruno Brasil.
De etanol a cosméticos
As microalgas são uma aposta para a oferta de biocombustíveis
no futuro. Elas têm três vantagens em especial sobre outros vegetais também utilizados para a produção
de combustíveis, como o milho e a soja: crescem rápido, não necessitam de grandes espaços para
cultivo e não reduzem a oferta de importantes alimentos humanos.
De acordo com a revista Exame, de 2010 para cá foi aplicado cerca de US$ 1 bilhão em 50 instituições
de pesquisa norte-americanas que atuam na produção de biodiesel a partir de microalgas. Elas também podem
produzir etanol. Os carros da Fórmula Indy, por exemplo, já foram impulsionados por etanol extraído de
microalgas por uma empresa norte-americana. No Brasil, o Centro de Pesquisa da Petrobras (Cenpes) analisa, em parceria com
universidades, o aproveitamento das microalgas. O grande entrave ainda é produzir o etanol de microalga a um preço
competitivo diante do petróleo e da cana-de-açúcar.
Marcio Busi acredita que assim que
essa barreira for superada se abrirão muitas oportunidades para a suinocultura e o dejeto de suíno passará
a ser cobiçado. "Como têm muitos nutrientes, os dejetos de suínos permitem a proliferação
rápida das microalgas. Basta apenas um controle de operação, fácil e barato, para que elas troquem
a quantidade celular de carboidratos e proteína por gordura. Assim, tornam-se matéria-prima de qualidade para
a produção de biodiesel", explica o pesquisador.
Sem o ajuste voltado ao biodiesel, as microalgas
alimentadas com efluentes da produção de suínos, ricas em carboidrato e proteína, podem ser destinadas
à produção de ração animal. Além de fornecer alimento para peixes, elas têm
potencial para substituir parcialmente o milho e a soja nas rações de aves e suínos.
As microalgas podem ainda ser a base para a oferta de produtos voltados à saúde humana. A Universidade
Federal de Santa Catarina (UFSC) realiza um estudo para extrair um bioativo de microalgas. Esse bioativo será usado
para gerar posteriormente um arroz enriquecido em betacaroteno, voltado a quem tem deficiência de vitamina A.
E há ainda o potencial para a indústria farmacêutica e cosmética. Pigmentos extraídos
das microalgas funcionam como antioxidantes biológicos. Eles se transformam em filtros naturais e já são
utilizados para a fabricação de batons com protetor solar.
Outro produto que já pode ser encontrado em lojas especializadas são as cápsulas de ômega
3 extraídas de microalgas. Segundo Márcio Busi, se essa indústria crescer ainda mais, a suinocultura
tende a se tornar um fornecedor importante de matéria-prima porque já tem o ambiente adequado para o crescimento
rápido das microalgas.
Informação de: Embrapa
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