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Publicado em 23/07/2013
A aviação comercial deverá reduzir em 50% as emissões de dióxido de carbono (CO2) até 2050 em relação ao que foi emitido pelos motores de aviões em 2005. Para isso, um grande esforço de pesquisa e desenvolvimento está sendo feito em vários países por instituições e empresas no sentido de alcançar um querosene não mais produzido de petróleo, mas de origem renovável, que lance menos gases nocivos na atmosfera. O bioquerosene, como está sendo chamado, tem grandes chances de levar o Brasil a novamente se tornar um centro de referência mundial importante para o desenvolvimento e produção de um biocombustível como foi com o álcool e o biodiesel. Essa tendência está destacada no estudo “Plano de voo para biocombustíveis de aviação no Brasil: plano de ação” apresentado no início de junho, em São Paulo, e patrocinado por duas das três maiores fabricantes de aviões do mundo, a Boeing e a Embraer, com financiamento da Fapesp e coordenação do Núcleo Interdisciplinar de Planejamento Energético (Nipe) da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp).
O estudo apresenta várias rotas tecnológicas que podem partir de matérias-primas –como a tradicional cana-de-açúcar até algas, gordura animal, óleos vegetais, material ligno-celulósico, amidos e lixo urbano – e utilizar variadas tecnologias de conversão e refino até a obtenção do bioquerosene. Nessas etapas, indica o estudo, ainda existem muitas lacunas importantes no âmbito tecnológico e de custos a serem preenchidas. São dificuldades técnicas que vão exigir a participação de todos os envolvidos, de fabricantes de aviões a empresas de aviação, desenvolvedores e fornecedores de combustível, além das entidades certificadoras mundiais. Outro fator a ser levado em consideração é o da logística de produção e distribuição do biocombustível para 108 aeroportos nacionais onde pousam as grandes aeronaves, o que representa 1 milhão de voos programados apenas no espaço aéreo brasileiro, além da necessidade de servir aos 62 mil voos internacionais que partem por ano do Brasil, com destino a 58 aeroportos de 35 países. Esses voos para o exterior representam 60% do consumo de querosene para aviação no país.
O bioquerosene para ser qualificado precisa de critérios específicos e rigorosos. É preciso que ele
satisfaça as mesmas especificações técnicas do combustível atual para ser considerado drop-in,
característica que garante o pronto abastecimento nos motores atuais e naqueles ainda em desenvolvimento, além
de poder ser misturado com querosene de aviação convencional. “É consenso que nas próximas
décadas não vai haver uma grande mudança tecnológica nos combustíveis para a aviação
comercial, como a incorporação de energia solar, células a combustível que funcionam com hidrogênio
ou baterias de lítio, por exemplo. Esses equipamentos ocupam muito espaço e são pesados, o que exige
maior gasto de combustíveis”, explica o professor Luís Augusto Cortez, vice-reitor de relações
internacionais da Unicamp e coordenador do estudo. “Não há como diminuir as emissões apenas com
a melhora da eficiência dos motores e por isso estamos incentivando a pesquisa para novos biocombustíveis”,
diz Mauro Kern, vice-presidente executivo de engenharia e tecnologia da Embraer. A empresa anunciou em junho a nova linha
dos seus jatos, a E2, que começa a voar a partir de 2018 com menos gastos de combustível e diminuição
das emissões.
Entre as tecnologias mais avançadas em desenvolvimento no Brasil e que foram citadas durante
o anúncio do estudo estão os bioquerosenes da Amyris e o da Solazyme, duas empresas de bioenergia, ambas com
origem no estado da Califórnia nos Estados Unidos. As duas fazem parte do grupo de parceiros no estudo coordenado pela
Fapesp. A primeira, já produz desde dezembro de 2012, no município de Brotas, no interior paulista, o farneseno,
um produto líquido feito a partir do caldo de cana com o uso de linhagens de leveduras Saccharomyces cerevisiae modificadas
geneticamente. A Solazyme também se vale de testes em aeronaves tanto para obter os certificados como para verificação
e análise dos fabricantes de aviões.
Para ser um fornecedor de bioquerosene, as empresas que desenvolvem
esse biocombustível precisam receber a aprovação da Sociedade Americana para Testes e Materiais (ASTM,
na sigla em inglês). Como parte desse processo, foram realizados voos-teste com no máximo 50% de biocombustível
misturado a igual porção de combustível tradicional. Foi o que aconteceu no dia 20 de junho, quando a
Amyris, junto com a Total, supriu com bioquerosene um Airbus 321 durante o Paris Air Show. “O combustível usado
foi produzido com cana-de-açúcar do Brasil”, diz Velasco. Antes, em junho de 2012, a empresa já
havia fornecido bioquerosene para um voo no Rio de Janeiro durante a Conferência Rio+20. Nesse caso, a aeronave foi
um jato E195 da Azul Linhas Aéreas, fabricado pela Embraer. Em junho deste ano, a Agência Nacional do Petróleo
(ANP) publicou a especificação brasileira para bioquerosene de aviação, alinhada com os procedimentos
internacionais, possibilitando que voos comerciais possam usar o biocombustível no país. Mais de 1.500 voos
comerciais e militares já foram realizados com misturas de querosenes renovável e fóssil.
Outra
tecnologia de fabricação de bioquerosene renovável, dessa vez desenvolvida na Faculdade de Engenharia
Química (FEQ) da Unicamp, sob a coordenação do professor Rubens Maciel Filho, está na escala de
laboratório e pronta para passar para uma linha de produção-piloto (ver Pesquisa Fapesp n° 164).
“Atingimos o máximo de produção que pode ser feita dentro de um ambiente de laboratório,
agora estamos trabalhando para captar recursos, ampliar a produção e fazer uma avaliação econômica
do nosso bioquerosene e em paralelo um estudo de sustentabilidade”, diz Maciel, que também é um dos coordenadores
do Programa de Pesquisa em Bioenergia (Bioen) da Fapesp. “Um acordo comercial está sendo negociado”, diz
ele sem revelar o nome da empresa. Nesse processo, vários óleos e gorduras podem ser usados conforme a disponibilidade
local, o que contribui com a logística de matéria-prima com importante impacto nos custos de produção.
“O biocombustível é produzido com óleos vegetais, etanol e um catalisador específico que
promove a reação sem a necessidade de microrganismos geneticamente modificados”, diz.
Os exemplos de processos em desenvolvimento no país para produção de bioquerosene renovável
mostram que o Brasil busca se firmar na linha de frente no mundo dos biocombustíveis. “O país tem vantagens
relevantes e uma situação diferente à do etanol e do biodiesel, cuja aceitação por parte
das empresas resultou do incentivo dos programas de governo. Agora é diferente. Existe uma demanda global por parte
das companhias de aviação para um combustível que emita menos CO2”, diz o professor Luiz Horta
Nogueira, da Universidade Federal de Itajubá (Unifei), em Minas Gerais, participante do estudo. O trajeto, até
caminhões de bioquerosene adentrarem os aeroportos para abastecer os aviões, ainda é longo e depende
também da comprovação de quanto cada biocombustível deixa de emitir CO2 e outros poluentes, em
comparação ao feito de petróleo. “Ainda temos uma dificuldade em estabelecer e analisar o ciclo
de vida das emissões do bioquerosene. Não existem dados confiáveis, conforme diagnosticado em nosso estudo”,
diz Cortez.
Informação de: BiodieselBR
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