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Publicado em 30/09/2014
A primeira ferramenta de mensuração das emissões de gases de efeito estufa na agropecuária, o GHG Protocol Agropecuária, acaba de ser lançada no mercado, desenvolvida por uma parceria do World Resources Institute (WRI) com a Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa) e a Universidade de Campinas (Unicamp).
Após dez anos de controle da febre de desmatamento da Amazônia (que chegou a desmatar 29 mil km2 num ano, em 1995), a agropecuária virou a segunda maior fonte de emissão de gases de efeito estufa (GEE) no país. Em 2012, o Brasil perdeu para a Indonésia o título constrangedor de campeão mundial do desmatamento, mas é o sétimo maior emissor de GEEs e assumiu compromissos globais para reduzir as emissões e preservar o clima e os recursos naturais, no âmbito do Protocolo de Kyoto.
O GHG Protocol é a ferramenta voluntária de gestão de gases-estufa mais usada no mundo, mas seus parâmetros foram estabelecidos em países de clima temperado. Talvez por isso, entre as 106 empresas brasileiras que já o adotam e publicam inventários de emissões regularmente, há apenas uma do setor de “agricultura, pecuária, produção florestal, pesca e aquicultura”. Agora, esse quadro pode mudar.
Um grupo poderoso de exportadores – JBS Friboi, Duratex, Grupo Maggi, Marfrig, BP Biofuels e Bunge – ajudou a testar os critérios e os parâmetros para definir uma ferramenta de gestão de emissões para a agricultura tropical, considerando seus diferentes biomas, práticas de adubação e os tipos de pastagem do país. “A JBS foi convidada pelos fundadores do GHG, que sentiram a necessidade de criar uma metodologia exclusiva para o Brasil, baseada na agricultura e na pecuária de clima tropical”, confirma Márcio Nappo, diretor de sustentabilidade do grupo. “Sozinho, o setor já responde por um terço das emissões de todo o país”, ressalta.
De fato, “o Brasil consolidou-se como celeiro fornecedor de alimentos ao mundo, mas ao mesmo tempo estamos entre os maiores emissores de gases de efeito estufa”, ressalta Rachel Biderman, diretora do WRI-Brasil. “Considerando a redução das emissões com mudanças do uso da terra, devido à queda do desmatamento, a agropecuária está se tornando uma das maiores fontes de emissões e já produz 29,7% do CO2 bruto do país” (veja quadro acima). Neste ano é provável um novo recorde na produção de grãos e oleaginosas (como algodão, arroz, feijão, milho, soja e trigo).
Controlar as emissões de GEE é um imperativo para sustar o aquecimento do planeta e expandir as exportações para a Europa e os Estados Unidos. Além disso, a gestão de emissões de gases proporciona aumento de competitividade das empresas, controle de riscos operacionais e de reputação, identificação de oportunidades de redução e sequestro de emissões, venda de créditos de carbono, conservação de energia, melhorias na qualidade do solo e no uso da água e aumento geral de produtividade.
É importante, entretanto, que o sistema não se torne mais uma burocracia intransponível para o produtor rural. “Acho difícil, porque é fácil de usar. Trata-se de uma planilha Excel com 15 perguntas, baseadas no inventário de gases do Ministério de Ciência e Tecnologia, adaptadas para a realidade da nossa agricultura”, afirma o pesquisador Eduardo Assad, da Embrapa, que ajudou a formatar o termômetro de carbono agrário. “O fazendeiro vai respondendo e no final sabe quantas toneladas de CO2 produz ou sequestra.”
Várias práticas agropecuárias são geradoras de emissões. “Tem a fermentação entérica dos animais (a flatulência, produtora do gás metano), o cultivo do arroz, a queima de resíduos, a preparação dos solos com fertilização de nitrogênio e o cultivo de organossolos”, explica Biderman. “Também há emissões relativas a atividades associadas, como produção de energia e conversão de uso do solo, de floresta para pastagem ou de um tipo de lavoura para outro.”
Vanguarda ambiental
Ninguém duvida que a agricultura de baixo carbono possa aumentar a vantagem competitiva do agronegócio tropical. Enquanto a Europa considera novidade o plantio direto (o sistema de manejo do solo que mantém os resíduos vegetais na superfície, garantindo fertilidade e proteção contra erosão), no Brasil ele já é a norma. Em junho, a revista americana Proceedings of the National Acadea m b i e n t e my of Sciences publicou um estudo afirmando que ao diminuir a aragem de terra (tornando- a mais clara e capaz de refletir a luz do sol), o sistema retém o carbono no solo e diminui a temperatura local em até 2ºC. “Eles estão muito atrasados”, observa Assad. “No Brasil, mais de 50% das propriedades já praticam formas de plantio direto para preservar o solo e controlar pragas.”
Em Chapadão do Céu, em Goiás, Carine Schneider, diretora do Grupo Wink, contou à PLANETA que sua empresa começou a fazer plantio direto em 1991 e logo avançou para a integração lavoura-pecuária. “Acoplamos uma caixa nas plantadeiras John Deere para, no momento em que plantamos milho, na entrelinha de uma carreira para outra, liberar semente de capim e plantar pastagem. Antigamente, as sementes eram lançadas ao solo de avião, mas o nosso sistema é muito mais eficiente.”
A Wink está interessada no GHG Protocol Agropecuário, mas teme pela sua operacionalidade. “Precisa ser algo claro, palpável e não burocrático. Precisamos aprender a inserir essa ferramenta em nossas atividades. Mas a renda dos créditos deve ficar mais na mão de quem trabalha para isso: o produtor," ressalta.
A empresa inscreveu quatro projetos no Plano ABC. “Encaminhamos mais dois este ano. Com os recursos, melhoramos nossos pastos, ampliamos a área de integração lavoura-pecuária e corrigimos melhor o solo, aumentando a produção”, afirma Schneider. “Acho que podemos avançar no mercado mundial porque teremos mais produto para comercializar produzido de maneira ambientalmente correta e economicamente mais viável.”
O grupo Bunge, que atua com mais de 16 mil fornecedores no Brasil, dispõe de certificações ambientais nas áreas de biodiesel e de soja, mas os parâmetros e as metas não refl etiam a realidade da sojicultura brasileira. “Agora temos diretrizes feitas no Brasil, que vão acelerar a gestão agrícola para adequação a nichos mais exigentes do mercado”, ressalta Rodrigo Spouri, especialista em sustentabilidade do grupo.
André Nassar, diretor da consultoria Agroícone, acha que a ferramenta facilitará a produção rural. “A inovação não está no instrumento, mas na perspectiva de o setor começar a utilizar as emissões como fator de performance. É importante ter fornecedores de carne, cana-de-açúcar e soja com garantias de legalidade e conformidade ambiental. Quem emite menos deve ser premiado.” Rachel Biderman lembra que há disposição internacional para definir um novo acordo mundial com metas de redução de emissões na COP- 21, marcada para 2015, em Paris. “Daqui a dois ou três anos o Brasil pode aprovar leis de redução de emissões que afetem o agronegócio. O produtor rural que fizer antes a lição de casa sobre a sua pegada de carbono terá uma vantagem considerável.”
A oportunidade está diante das empresas. Enquanto a Europa, apesar de possuir solos mais férteis, produz durante seis meses do ano, a agricultura tropical proporciona três colheitas e “safrinhas” durante o ano inteiro. Com a agricultura de baixo carbono, a vantagem tecnológica será intensificada. Num primeiro momento, o termômetro de GEE do campo poderá ser útil para 1 milhão de proprietários rurais médios e 500 mil grandes produtores. Mas se chegar à agricultura familiar o patamar cresce. Há 5,6 milhões de propriedades rurais no país.
Fonte: Planeta
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