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Publicado em 03/09/2014
Pesquisadores presentes no "Segundo Workshop Internacional para Regulação da Biotecnologia Animal", realizado na semana passada, de 18 a 21 de agosto, em Brasília (DF), foram unânimes: os marcos regulatórios pertinentes a essa área da ciência muitas vezes não acompanham a velocidade com a qual o conhecimento científico avança. O resultado é a demora para que produtos gerados pela pesquisa cheguem ao mercado. No campo da biotecnologia animal, em que os avanços e os benefícios dele decorrentes nem sempre são bem divulgados ou compreendidos, essa demora compromete o processo de inovação e até mesmo as possibilidades de financiamento de novas pesquisas. Outro problema apontado pelos cientistas é a diferença que existe entre os marcos regulatórios dos países.
O tema tem mobilizado instituições como o Departamento de Agricultura dos Estados Unidos (USDA), a Universidade da Califórnia (Universidade de Davis, Estados Unidos), a Universidade de Fortaleza (Unifor), a Commonwealth Scientific and Industrial Research Organisation (CSIRO - órgão nacional para pesquisa científica na Austrália), a Recombinetics (empresa privada norte-americana que atua na área de genética para biomedicina e agricultura) e o Ministério da Agricultura, Pecuária e Pesca da Argentina, que se juntaram à Embrapa para a realização do Workshop. A abertura do evento contou com a participação do diretor-executivo de Pesquisa e Desenvolvimento, Ladislau Martin Neto.
Cientistas e profissionais da área de regulação, representando 25 países de quatro dos cinco continentes (não houve representantes de países europeus nessa segunda edição do evento; a primeira edição foi realizada em 2011 na Argentina), discutiram os marcos regulatórios voltados à avaliação da segurança alimentar e ambiental de produtos provenientes dos animais gerados a partir das técnicas da biotecnologia.
A intenção foi promover o diálogo entre aqueles dois públicos-alvo do evento; descrever as oportunidades e o potencial representados pela biotecnologia animal tanto para a produção de alimentos quanto de fármacos; traçar recomendações para garantir a segurança dos produtos dela derivados; avaliar o estado da regulamentação em diferentes países, e, principalmente, identificar desafios e apresentar ideias para a harmonização global das regulamentações na área e caracterizar os impactos regulatórios sobre a inovação e a aceitação e a adoção das tecnologias pela sociedade e setores produtivos e, finalmente, sobre o comércio internacional.
Protocolos
Luiz Sérgio Camargo, pesquisador da Embrapa Gado de Leite (Juiz de Fora, MG), e Luciana Bertolini, da Unifor, ambos da equipe de organização do evento, destacaram, em entrevista ao Todos.com, o fato de que cada país tem seus próprios marcos regulatórios. Na maioria das vezes, os cientistas, que estão fora do processo de regulação, desconhecem os protocolos que devem ser seguidos.
"Os pesquisadores cumprem o processo de experimentação, de testes e de avaliação dos impactos da tecnologia segundo os protocolos de seus países. Mas um produto aprovado comercialmente em um país pode não ser comercializado em outro pelo fato de não terem sido cumpridas, durante a pesquisa e o desenvolvimento, exigências específicas, o que implica a necessidade de outros experimentos e testes", disse Luiz Sérgio. "Já os setores empresariais responsáveis pela comercialização de produtos avaliam também o potencial que dada tecnologia tem de avançar inclusive em mercados externos. Pensam na amplitude do retorno comercial. Daí a importância da harmonização dos marcos regulatórios e dos protocolos da pesquisa e regulação", completou.
"Estamos vivendo em torno de uma economia mais globalizada. Buscar harmonia na maneira como se dá a regulamentação e a liberação de um produto resultante da biotecnologia é essencial. Pois muitas vezes os produtos adotados são os mesmos ou semelhantes. O milho transgênico plantado no Brasil é o mesmo daquele plantado nos Estados Unidos; os consumidores, excetuando-se suas características culturais e diferentes pontos de vista, são parecidos", disse Luciana Bertolini. Continuou: "A expectativa de consenso justifica eventos importantes como este Workshop. E são fundamentais as discussões sobre o que se deve avançar em termos de regulação, em função das novas tecnologias que estão surgindo. A ciência está evoluindo rapidamente, mas a regulação não".
Bons exemplos
Jim Murray, professor da Universidade da Califórnia e também organizador do evento, chamou atenção para o fato de que os entraves no processo regulatório acabam por dificultar também aos cientistas o financiamento de suas pesquisas. "É preciso que as tecnologias cheguem ao mercado, que haja bons exemplos dos seus benefícios, para que agentes financiadores se interessem por apoiar mais a pesquisa e os processos de desenvolvimento. Se nada é liberado ou comercializado, como convencê-los a investir na pesquisa ou na tecnologia dela resultante? Como informar melhor a população sobre os benefícios da tecnologia se ela não está sendo comercializada? A população precisa ver o resultado concreto".
O professor lembrou, na entrevista ao Todos.com, a linhagem transgênica do Aedes aegypti desenvolvida pela empresa britânica Oxford Insect Tecnologies (Oxitec). Por meio da manipulação genética, os britânicos inseriram, em uma população de machos do mosquito transmissor da dengue, criada em laboratório, um gene modificado que produz uma proteína que mata a prole resultante do cruzamento com fêmeas normais. O resultado é a redução da incidência do mosquito no ambiente e da aplicação de inseticidas para combater os insetos. A liberação autorizada pela Comissão Técnica Nacional de Biossegurança (CTNBio) do mosquito no Brasil, sob a responsabilidade da equipe da pesquisadora Margareth Capurro, da Universidade de São Paulo (USP), em parceria com empresa privada nacional, tem, na avaliação de Murray, boa receptividade por parte das populações em geral. "Trata-se de uma tecnologia que promete impacto positivo nos locais onde a dengue é um problema. O povo que vive nessas áreas poderá conferir os efeitos benéficos para sua saúde. É algo concreto. Precisamos ter exemplos como esses para convencermos empresários e a população sobre o potencial comercial e os benefícios da biotecnologia animal", afirmou Jim Murray.
O professor disse que a celeridade com a qual a CTNBio aprovou a liberação do mosquito transgênico deve ser acompanhada também pelas agências reguladoras brasileiras que atuam após a aprovação pela Comissão. Lamentou que nenhuma delas estivesse representada no Workshop. "É a mesma situação que ocorre nos países em geral, é preciso maior compreensão sobre a tecnologia e maior rapidez na avaliação por parte dos órgãos reguladores".
Segundo Murray, o evento proporcionou também a oportunidade para que representantes de países em desenvolvimento, como os da África, tivessem maior contato com o que está acontecendo em termos de inovação na área de biotecnologia animal e de processos de regulação dos produtos dela decorrentes. Dos 25 países representados no Workshop, só cinco estão mais adiantados na área da regulação. O Brasil, segundo Luiz Sérgio Camargo, foi elogiado pelo público participante do evento pelos avanços na legislação, a exemplo da Lei 11.105/05, e pela existência de instâncias como a CTNBio.
Parceria
Robert Hoff, ministro conselheiro do Departamento de Agricultura dos Estados Unidos (USDA), e do Escritório de Assuntos Agrícolas, da Embaixada dos Estados Unidos da América no Brasil, acompanhou e elogiou o evento. "O Workshop proporcionou maior conhecimento sobre a biotecnologia, sobre essa ciência que pode fazer frente à necessidade de mais alimentos para uma população mundial em crescimento, e para a garantia da segurança alimentar. Permitiu ainda a troca de informações sobre o que está acontecendo nos países em termos de inovação e regulação".
Hoff destacou a parceria entre a Embrapa e o Agricultural Research Service (ARS). "A Embrapa é uma instituição reconhecida em todo o mundo, seus pesquisadores são excelentes, e os do ARS também. Nossa expectativa é a de fortalecer e ampliar essa cooperação". Segundo ele, o USDA fez um inventário sobre os projetos de pesquisa agropecuária entre Estados Unidos e Brasil. "Chegamos a 120 projetos, um número que consideramos muito bom. Envolvem a Embrapa ou outras instituições e universidades", disse o ministro. Sobre isso, Jim Murray lembrou que há ainda os arranjos informais, não contabilizados, o que, segundo ele, aumenta muito esse número e comprova o relacionamento de longa data entre os dois países na área da pesquisa agropecuária.
Importância para a Indústria Animal Paranaense
A indústria animal paranaense, segundo o trabalho das Rota Estratégica para o Futuro da Indústria Paranaense – Roadmapping da Biotecnologia Aplicada à Indústria Animal , publicado em 2005, na visão 2, que trata de Melhoramento Genético Animal - "Paraná Referência em Genética e Melhoramento Animal", vislumbra a genética e melhoramento animal como setores de desenvolvimento que podem ser potencializados pela biotecnologia, contribuindo para melhoria dos índices de produtividade das criações, de lucratividade para o produtor rural e de qualidade do produto final para o consumidor.
Fonte: Embrapa Recursos Genéticos e Biotecnologia e Observatórios SESI/SENAI/IEL
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