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Saiba o que está na vanguarda do melhoramento genético

Publicado em 07/05/2018

Uma semente de soja tem formato redondo, geralmente com cerca de 6 milímetros de diâmetro e menos de 0,2 gramas. A semente de milho, por sua vez, pode ser esférica ou achatada e pesa cerca de 0,3 gramas. Quem olha esses pequeninos insumos muitas vezes não tem noção da tecnologia que cada semente carrega e como elas seguem em evolução.

O desenvolvimento de cultivares engloba o melhoramento genético, por meio do cruzamento de plantas para a produção de sementes híbridas, e a biotecnologia, com a manipulação de um gene in vitro que é inserido no genoma da planta, criando uma cultivar transgênica. A engenharia genética trabalha com as mesmas características que os programas de melhoramento sempre trabalharam, o que muda é apenas a estratégia, diz Francisco Aragão, pesquisador da Embrapa Recursos Genéticos e Biotecnologia.
Segundo os especialistas, não faz mais sentido dissociar esses dois conceitos, pois eles caminham juntos com um objetivo bem óbvio: inovar e gerar melhores resultados no campo. Para o produtor, o que interessa é saber que centenas de pesquisadores estão trabalhando para desenvolver novas cultivares, cada vez mais fortes para resistir às pragas e doenças no campo. Saiba o que está na vanguarda e os desafios da ciência.
O que está por vir?
Uma promessa clara é acelerar as pesquisas e lançamentos de novas cultivares. O descobrimento de novos traits [traços genéticos] deve ser mais rápido. Teremos mais opções para o controle de lagartas e plantas daninhas, afirma Alex Merege, Diretor de Sementes da Bayer para América Latina. Há uma tendência de aumento de investimento em pesquisa. O importante é tentar otimizar esse investimento.
 
De acordo com Geraldo Berger, líder da área de Regulamentação da Monsanto para a América do Sul, o custo de geração de dados diminuiu. Além disso, há um conjunto de novas técnicas e ferramentas de biologia molecular associadas ao melhoramento genético que vão surpreender o mercado. Estamos vivendo agora um momento de muita inovação, diz Berger.  
Porém, ainda não dá para ter todos os desejos atendidos numa só semente. A dificuldade para os pesquisadores é manter as características que temos hoje e ampliar a base com tolerância a herbicidas, resistência a pragas e novas características como tolerância ao estresse hídrico, afirma Berger.

Xô, seca!

Certamente, um grande sonho dos produtores é se livrar dos prejuízos causados por secas. A boa notícia é que isso está no alvo dos pesquisadores. A engenharia genética está evoluindo e ampliando o foco. Está se preocupando mais com fatores abióticos, o que significa combater problemas que não são gerados por outros seres vivos, diz Aragão, da Embrapa. Ele contou que já existe uma cultivar de milho transgênico que é tolerante à seca nos Estados Unidos e uma variedade de cana com essa característica, na Indonésia.
 
No entanto, segundo o pesquisador, um dos desafios ao desenvolver sementes resistentes ao estresse hídrico é definir parâmetros precisos para a resistência. O que é considerado uma seca. Num solo argiloso o impacto da seca é uma coisa, num solo arenoso é diferente, afirma Aragão. É mais difícil encontrar os genes resistentes à seca e desenvolver estratégias. E, do ponto de vista comercial, também é mais difícil medir o desempenho desse produto no campo.  
Berger, da Monsanto, contou que a empresa está desenvolvendo um traço genético de resistência à seca para o milho e reforçou esse desafio. A definição de tolerância é difícil de estabelecer. A planta não vai tolerar um período de restrição hídrica por muito tempo, afirma Berger. O conceito é que a planta não reduz a produtividade, se comparada com a planta que não tem essa característica. E chovendo normalmente, não há impacto no rendimento.


Ferrugem asiática

O produtor também deve se perguntar por que não se livra da Ferrugem Asiática de uma vez por todas. A ferrugem da soja é uma preocupação muito grande e temos genes identificados que controlam [a doença]. Mas a espécie da ferrugem apresenta várias raças, diz Berger, da Monsanto.
 
Por isso, a resposta dos pesquisadores é a complexidade e a evolução do problema. Por questões de biologia, o fungo causador da ferrugem muda. Tem vários tipos de ferrugem asiática. Achar uma solução que controle tudo é sempre difícil, afirma Merege. De acordo com o diretor de sementes, a Bayer está desenvolvendo uma pesquisa em parceria com a Embrapa para monitorar a ferrugem asiática, identificar mutações do fungo causador da doença e mecanismos de resistência aos fungicidas.

Mosca branca

Não há uma grande oferta de inseticidas capazes de controlar a mosca branca e, cada vez mais, as infestações preocupam os produtores de grãos. A biotecnologia já está caminhando para encontrar uma solução, segundo Aragão. Pesquisadores estão testando uma sequência de DNA capaz de gerar uma planta resistente ao inseto.
 
A Embrapa está utilizando o alface como planta modelo para os testes, mas o objetivo é desenvolver a tecnologia de resistência para a soja, ainda sem previsão de lançamento. Os genes raramente vão direto para a planta-alvo, testamos em um modelo onde os resultados são gerados mais rapidamente, diz Aragão.  

Precocidade é o foco

A Bayer está regionalizando o seu programa de melhoramento genético para desenvolver novas cultivares de soja de ciclo curto. Segundo Merege, o produtor quer manter uma produtividade alta reduzindo o ciclo da soja. Quanto menor for o ciclo, menos estará exposto a riscos, menos aplicações de defensivos e custo menor também, diz.
 
Os produtores demandam novidades, especialmente na região Centro-Oeste, já que o produtor quer colher a soja o quanto antes para semear a segunda safra de milho. O Brasil permite ter duas safras. Temos que considerar os sistemas produtivos e essa interação, pensando na melhor forma de manejar a safra seguinte, afirma ele. 
Mas, segundo Merege, também não basta apenas oferecer uma cultivar super precoce. Conseguiríamos fazer variedades com ciclo de 70 dias no Norte, por exemplo, mas o teto produtivo seria muito baixo. O desafio é manter a produtividade. 
A Monsanto também desenvolve pesquisas considerando a interação entre duas safras. Segundo Berger, o cultivo de arroz irrigado por inundação na região Sul do Brasil é feito em rotação com a soja. Por isso, os produtores precisam de plantas que se desenvolvam bem em solo encharcado. A gente já está testando produtos via melhoramento genético, é um mercado com bom potencial, diz Berger.

Nematoides e lagartas


O nematoide do cisto e das galhas estão no radar da Monsanto, de acordo com Geraldo Berger. Há um trabalho de mapeamento genético para identificar linhagens de soja que possuem diferentes genes de resistência. É um trabalho muito difícil. É um bicho resistente e há muitas raças de nematoides, diz Berger. Mas, num futuro breve a gente vai poder ter materiais mais tolerantes.

 Ainda assim, o líder da área de Regulamentação da Monsanto também reforça que as boas práticas agrícolas devem continuar para combater os nematoides. É muito importante que [o produtor] faça rotação de culturas como mecanismo de controle ou a variedade se torna suscetível, diz.  
No caso das sementes de milho, o maior foco é a resistência às lagartas. O milho tem muitos problemas causados por insetos, o custo do inseticida é maior na cultura do milho que na soja, diz Aragão, da Embrapa. Mas, independentemente do tipo de praga, é o clima que orienta as pesquisas, segundo Merege, da Bayer. Temos que avaliar as condições regionais. Se um veranico sempre acontece numa determinada época, o melhorista vai levar isso em consideração.  
Em países de clima temperado, como os Estados Unidos, as baixas temperaturas durante o inverno ajudam na defesa vegetal. Já no Brasil, o clima tropical faz com que as lavouras sejam um prato cheio para o desenvolvimento das pragas e doenças durante todo o ano. Temos uma ponte verde e as populações de insetos não param, diz Merege. Segundo ele, pode haver falhas de eficiência do trait e ao longo do tempo os insetos ganham resistência às tecnologias. A biotecnologia não é uma solução sozinha e única.
Por que a ciência é lenta?
O tempo necessário para lançar uma nova semente transgênica é de cerca de 10 anos. De acordo com os especialistas, a culpa não é da ciência. A responsabilidade por boa parcela desse prazo recai no registro do produto, um processo lento que exige aprovação no país de origem da tecnologia e nos mercados que importarão a soja ou milho transgênico. Existem centenas de tecnologias agrícolas que poderiam ser usadas, mas o sistema regulatório é muito rígido e dificulta a chegada ao mercado, diz Aragão. Berger, da Monsanto, concorda. A gente precisa ter um processo mais fluido para acelerar os avanços da biotecnologia. Isso realmente é uma preocupação, diz Berger.
Alerta geral: as sementes precisam de proteção
Produtor pode ser obrigado a adotar áreas de refúgio para garantir a eficiência das tecnologias no longo prazo
 
As sementes transgênicas disponíveis no mercado brasileiro podem ficar com os dias contados. A velocidade de desenvolvimento de novos eventos genéticos é lenta. É preciso proteger as tecnologias, diz Francisco Aragão, pesquisador da Embrapa Recursos Genéticos e Biotecnologia.  
Segundo ele, o gene bt está presente nas sementes de soja, milho e algodão e não há rotação de culturas e de produtos com diferentes modos de ação para garantir a eficácia das tecnologias no longo prazo. As pragas vão criando tolerância até o dia que a semente e o defensivo não têm mais efeito. O que se tenta é retardar isso usando refúgio, diz o pesquisador.  
A situação é alarmante, especialmente a resistência de insetos como a lagarta do cartucho nas lavouras de milho, segundo Geraldo Berger, líder da área de Regulamentação da Monsanto para a América do Sul. A gente está vivendo um momento preocupante. Temos uma alta pressão de pragas e a adoção de refúgio está aquém ao recomendado, afirma.
Refúgio obrigatório?
Não é de hoje que as empresas alertam sobre a resistência de insetos. A principal recomendação para driblar o problema é a adotar áreas de refúgio, com o plantio de sementes convencionais em uma área de pelo menos 20% das lavouras de soja e de 10% para o milho. Essa prática retarda o processo de seleção natural dos insetos e prolonga a eficiência das sementes transgênicas.
 
Como as cultivares convencionais geralmente registram menor produtividade e renda no curto prazo, muitos produtores se recusam a fazer esse manejo. Porém, o mercado poderá exigir uma mudança de comportamento. O governo já estuda uma forma de tornar a adoção de refúgio obrigatória, como medida vinculada à liberação de crédito do Plano Safra 2017/2018.  
Na prática, pode significar que, ao contratar o crédito rural para custear uma lavoura com sementes transgênicas, o agricultor tenha que comprovar a adoção de áreas de refúgio na fazenda. Devido à importância do tema, a sugestão é colocar o tema refúgio dentro das perspectivas de financiamento de custeio da safra, diz Luis Eduardo Rangel, secretário de Defesa Agropecuária do Ministério da Agricultura. Só com educação, a curva de adoção das áreas de refúgio não foi suficiente. A gente está tentando achar outras estratégias, inclusive modificação de legislação se for o caso.

Fonte: UOL
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