Novo cultivar de maracujá chega ao mercado
Publicado em 05/08/2015
Os primeiros frutos de maracujá silvestre BRS Pérola do Cerrado, primeira cultivar de maracujá silvestre
lançada pela Embrapa, começam a chegar às mesas dos consumidores do Distrito Federal. Aos sábados,
os produtores do Núcleo Rural do Pipiripau, em Planaltina (DF), comercializam a nova variedade em uma banca na Ceasa-DF.
Em menos de um mês, foram vendidos entre 40 e 50 quilos do fruto, ao preço de R$ 10 o quilo.
Apesar de pertencer à família dos maracujás, a cultivar BRS Pérola do Cerrado tem tamanho,
cor, forma e sabor que pouco lembram o maracujá comercial. O fruto maduro tem coloração verde-claro a
amarelo-claro, com listras longitudinais verde-escuras. O peso varia entre 50g e 120g. Por ser muito diferente da que é
normalmente encontrada no mercado, a cultivar não compete com as variedades comerciais, podendo ser considerada, de
fato, um novo fruto que chega ao consumidor.
"Estamos entrando no mercado paulatinamente. Os produtores estão organizados na Associação, que
vai crescendo junto com a BRS Pérola do Cerrado. À medida que tivermos maior produção, poderemos
atender um mercado maior", afirma Carlos Daher, presidente da Associação dos Fruticultores Familiares e Produtores
de Maracujá do Distrito Federal e Entorno (Aprofama), que reúne cerca de 40 produtores.
Em todo o País, são aproximadamente 150 produtores do BRS Pérola do Cerrado, dos quais 70% estão
concentrados no Distrito Federal e Entorno. O restante está principalmente em Minas Gerais, Rio de Janeiro, Mato Grosso
e Goiás. Cada propriedade tem em média cem plantas e a produtividade estimada é de 20 a 35 toneladas
por hectare ao ano.
Embora ainda não tenha uma estimativa da produção, o presidente da Aprofama espera ampliar as ações
de mercado com a próxima safra no DF, prevista para agosto. A ideia é introduzir o BRS Pérola do Cerrado
na merenda escolar de escolas da rede pública de ensino do DF. Para conhecer a aceitabilidade do fruto e produtos alimentares
derivados do novo maracujá, a Emater-DF realizou, em junho deste ano, um teste com estudantes do Centro de Ensino Fundamental
Pipiripau II. O resultado foi amplamente satisfatório: 90% dos alunos aprovaram o docinho (tipo beijinho), 80% o fruto
in natura e 55% o iogurte.
O BRS Pérola do Cerrado tem grande potencial para cultivo em sistema orgânico por ser mais resistente a
doenças e pragas que o maracujá comercial. Leda Gama, de Sobradinho (DF), foi uma das produtoras que participaram
da etapa de validação da variedade e já comercializa os frutos. Uma vez por semana, ela participa de
uma feira de orgânicos em Brasília (DF). "Minha expectativa é maravilhosa, e digo que a aceitação
é total. Todos que provam, amam", afirma.
Durante cinco anos, Geraldo Magela, extensionista da Emater-DF, acompanhou o trabalho de validação a campo
junto aos produtores do DF. Ele acredita que o BRS Pérola do Cerrado vai representar um avanço na cultura do
maracujá no Brasil. "É um material rústico e que não precisa de polinização manual.
Além de tudo, é muito saboroso. Será um sucesso", aposta.
Aparência x Qualidade
A cultivar de maracujá silvestre BRS Pérola do Cerrado veio para mudar a percepção do consumidor
quanto à aparência do fruto, que tem tamanho pequeno e nenhuma semelhança com o maracujá comercial.
E com um detalhe inusitado: quanto mais murcho e feio, mais saboroso.
"Vamos precisar mostrar ao consumidor que se trata de outro fruto. Ele não poderá compará-lo com
a aparência do maracujá comercial. Além do tamanho e da cor, o BRS Pérola do Cerrado tem um sabor
diferenciado. É adocicado, de aroma agradável e de baixa acidez", ressalta Ana Maria Costa, pesquisadora da
Embrapa Cerrados (Planaltina, DF) e coordenadora da Rede Passitec - Desenvolvimento tecnológico para uso funcional
das passifloras silvestres, que reúne mais de cem pesquisadores de 27 instituições e gera informações
sobre o uso e o aproveitamento de passifloras silvestres para o fortalecimento da cadeia produtiva.
Lançado em 2013, o novo maracujá é um produto resultante de quase 20 anos de pesquisas em melhoramento
genético convencional, que compreende cruzamentos de acessos da espécie Passiflora setacea coletados
em diferentes regiões do Cerrado brasileiro. Trata-se da primeira cultivar de maracujazeiro silvestre desenvolvida
pela Embrapa já disponível para os fruticultores e consumidores.
As qualidades nutricionais do BRS Pérola do Cerrado compensam a falta de atrativo visual. Os frutos têm
rendimento de polpa superior a 40%. De cor amarelada, a polpa apresenta sabor característico delicado, podendo ser
consumida fresca ou em pratos doces ou salgados. O novo maracujá é, por isso, uma opção para o
mercado de frutas especiais e de alto valor agregado, principalmente quando produzido em sistemas orgânicos e agroecológicos.
A polpa é rica em minerais importantes para a saúde, como magnésio, ferro, fósforo e zinco.
Cem gramas de polpa do fruto, o que equivale a dois copos, contêm de 34% a 39% das necessidades diárias
de ferro, 21% a 27% de magnésio, 22% a 32% de fósforo e 23% a 37% de zinco. Em termos comparativos, ela é
mais rica que a polpa do maracujá comercial (Passiflora edulis) em enxofre, cálcio, boro e manganês.
Além disso, tem maiores teores de fósforo e potássio que a polpa da acerola e igual teor de ferro.
As características químicas da polpa, que contém compostos antioxidantes (compostos fenólicos
e aminas bioativas), permitem que o novo maracujá seja usado como alimento funcional. Esses compostos atuam na prevenção
de doenças degenerativas e no fortalecimento da resposta imunológica, contribuindo para a manutenção
da saúde.
Na BRS Pérola do Cerrado, os compostos fenólicos têm concentração de 50 mg a 77 mg
por 100g de polpa, o dobro de compostos fenólicos do maracujá comercial, do cupuaçu e do abacaxi. Em
relação às aminas bioativas, o novo maracujá apresenta teores na faixa de 14 mg por 100g de polpa,
o que corresponde ao dobro do valor presente no maracujá comercial e a 40 vezes mais que o encontrado numa maçã.
Por fim, uma curiosidade: o maracujá Passiflora setacea é conhecido popularmente como
"maracujá do sono", pois a polpa dos frutos, segundo o uso popular, ajudaria a prevenir problemas de insônia.
Estudos conduzidos pela Universidade de Brasília com a BRS Pérola do Cerrado têm apontado que o consumo
da cultivar pode contribuir para a prevenção de problemas relacionados ao estresse.
Aproveitamento integral do fruto
O trabalho de desenvolvimento tecnológico pela Embrapa e seus parceiros tem viabilizado o uso integral do fruto
(polpa, casca e sementes), das folhas, flores e ramas para produção de ingredientes e de matéria-prima
para as indústrias de alimentos, condimentos, cosmética, de artesanato e farmacêutica.
A partir da casca da BRS Pérola do Cerrado (e também do maracujá comercial), que tem alto teor de
fibras, a Embrapa desenvolveu um ingrediente rico em fibras que pode ser usado na composição de bolos, pães,
sorvetes, musses, doces e pratos salgados.
Já a semente pode ser aproveitada, entre outros usos, para a produção de óleo, cuja composição
tanto permite o consumo alimentar como o uso cosmético. Trata-se de um óleo muito rico em ômega 6, importante
na formação das membranas celulares, principalmente das mitocôndrias, auxiliando também no equilíbrio
do colesterol no organismo.
Vantagens para quem planta
Por se tratar de um maracujá silvestre, a cultivar BRS Pérola do Cerrado apresenta alta resistência
a pragas e doenças, característica importante para reduzir a aplicação de defensivos agrícolas,
o que traz benefícios econômicos, ambientais e ao consumidor. A rusticidade da cultivar tem viabilizado a produção,
inclusive, em sistemas orgânicos e agroecológicos.
A produtividade anual – 20 a 35 toneladas por hectare, dependendo do sistema de condução das plantas
– é muito superior à da média nacional, cerca de 15 toneladas por hectare ao ano. As condições
de cultivo e produção são semelhantes às do maracujazeiro azedo. A produção dos
frutos começa a partir dos oito meses de vida da planta, que produz por pelo menos quatro anos, mas pode chegar a 15
com manejo adequado.
"O BRS Pérola do Cerrado produz o ano inteiro sob irrigação, com pico de produção
na época das chuvas (dezembro a março) e uma segunda safra entre junho e setembro (período seco). Entre
uma safra e outra, a produção diminui, mas não para", garante a pesquisadora Ana Maria Costa.
"Esse maracujá não compete com o azedo (comercial). É um fruto que veio para agregar valor e diversificar
os sistemas de produção dos fruticultores", completa o pesquisador Fábio Faleiro, também da Embrapa
Cerrados e responsável pelo programa de melhoramento genético do maracujazeiro silvestre da Embrapa. Isso porque
a cultivar frutifica nas condições de outono-inverno do Brasil Central, possibilitando a produção
na entressafra do maracujá azedo.
A produtora Francisca Inês, do Assentamento Oziel Alves III, em Planaltina (DF), está apostando no BRS Pérola
do Cerrado. Há seis meses, ela plantou cem mudas em sistema agroecológico e está esperando por bons resultados.
"Por ser rústico, é o ideal para a minha área, que é muito seca. Acredito que produzirá
muito bem e que esse maracujá será o pontapé inicial para o meu sucesso", disse. Para a comercialização
da sua produção, Francisca está aguardando apenas a certificação do maracujá como
produto orgânico.
O diferencial de mercado da cultivar se dá em função da quádrupla aptidão: consumo
in natura, processamento industrial, ornamental e funcional. Todas essas características têm despertado o interesse
de muitos fruticultores e consumidores, com uma perspectiva de fortalecimento e crescimento da cadeia produtiva.
O processamento industrial está relacionado ao uso da polpa para fabricação de sucos, sorvetes,
doces e outros alimentos. A aptidão ornamental se deve às belas flores brancas e à ramificação
densa, ideal para paisagismos de grandes áreas, como cercas, pérgulas e muros. Já a aptidão funcional
refere-se à qualidade da polpa em termos da presença de nutrientes e compostos que atuam na prevenção
de doenças.
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