Publicado em 11/01/2017
Fonte: Folha
A disputa comercial movida pela União Europeia e o Japão contra sete regimes da política industrial brasileira traz lições. O Brasil perdeu o caso na fase do painel, equivalente à primeira instância do sistema de solução de controvérsias da OMC (Organização Mundial do Comércio). Cabe recurso na segunda instância, mas é pouco provável que haja reversão significativa das decisões.
Quando finalizada essa etapa, o Brasil terá atravessado sua pior derrota na OMC. Houve outros dois casos em que instrumentos da política industrial local foram questionados por parceiros -o regime automotivo do governo FHC e o apoio do Proex à Embraer. Em nenhum deles houve uma contestação (e condenação) tão ampla.
Apesar da derrota, o Brasil continua a ser o quarto maior usuário do sistema de solução de controvérsias da organização, o maior entre os países em desenvolvimento e o mais ofensivo entre os membros do G20, atrás apenas do Canadá. Nos últimos dois anos, o país iniciou quatro disputas para assegurar o acesso a mercado para açúcar (Tailândia), produtos siderúrgicos (EUA) e carnes (Indonésia, duas vezes). Assim, a primeira lição é que participar da OMC continua a ser um bom negócio.
Na disputa atual, o Brasil foi condenado por utilizar regimes que, grosso modo, baseiam-se em quatro medidas proibidas: discriminação tributária entre produto doméstico e importado, subsídios vinculados à exigência de conteúdo local, subsídios à exportação e exigências relacionadas à realização de investimento direto estrangeiro.
De fato, parte desses regimes viabilizou investimentos em segmentos específicos da indústria brasileira, que, provavelmente, não se realizariam em sua ausência. No entanto, alguns dos instrumentos poderiam ser substituídos por políticas horizontais, pois sua função é assegurar que as empresas possam competir sem serem afetadas pelo “custo Brasil”.
Como consequência, a segunda lição da disputa é que a derrota cria um estímulo positivo à realização de reformas há muito adiadas, como a tributária.
Por fim, cabe uma afirmação sobre a natureza dos acordos da organização. A OMC não é antipolítica industrial “per se”, mas é fato que instrumentos utilizados no passado pelas atuais potências comerciais não estão mais disponíveis a países como o Brasil.
Desse modo, a terceira lição da disputa é que governo e setor privado brasileiros devem avaliar, com calma, como formular e executar política industrial.
Há três caminhos possíveis: adequá-la às regras existentes, negociar a modificação das regras (processo com elevado grau de incerteza e prazo longo) ou adotar e manter regimes vulneráveis a questionamentos.
Toda grande economia que perde um caso dessa magnitude avalia esses caminhos. Para tanto, o primeiro passo é, justamente, reconhecer as lições dessa disputa.
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