Publicado em 09/01/2017
Fonte: Estadão
Enquanto o desemprego no Brasil se aproxima de 12% em meio a dois anos seguidos de encolhimento da economia, há indústrias brasileiras abrindo novas fábricas e criando milhares de novos empregos diretos. Esses investimentos, no entanto, são realizados no Paraguai, país que quer aproveitar a proximidade com o Brasil para ser uma plataforma de produção barata e livre de burocracia para o abastecimento do mercado de consumo brasileiro.
A estratégia de atrair investimentos e empregos ao abrir mão da cobrança de impostos tem dado resultado. A lei da maquila, que garante o pagamento de apenas 1% de tributo às companhias que abrirem fábricas no Paraguai e exportarem 100% da produção, existe desde 1997. Outras vantagens incluem gastos menores com mão de obra e energia elétrica. O salto quantitativo desse programa, porém, se deu nos últimos três anos – justamente quando a economia brasileira começou a andar para trás.
Embora o total de empregos gerado pelas “maquiladoras” ainda seja pequeno em comparação ao tamanho da economia brasileira, o ritmo de migração de investimentos do Brasil para o Paraguai está em aceleração. Das 124 indústrias incluídas no programa de maquilas, 78 abriram as portas desde 2014. Dos 11,3 mil empregos gerados pelo programa, 6,7 mil são fruto dos investimentos dos últimos três anos. E existem mais projetos de expansão que devem gerar milhares de vagas em 2017.
Interesse. O Foro Brasil-Paraguai, sediado em Assunção e dedicado exclusivamente a apresentar as oportunidades do país a brasileiros, recebe dezenas de consultas por semana. A entidade calcula que dois terços dos investimentos no Paraguai nos últimos anos sejam de empresas de capital brasileiro. Mas o País também tem um forte peso no terço restante: as montadoras estrangeiras começaram a produzir peças em solo paraguaio para abastecer as montadoras instaladas no Brasil.
A transformação do Paraguai em uma “China da América do Sul” é um projeto do presidente Horacio Cartes, no poder há três anos. A prioridade de Cartes – que também é um dos empresários paraguaios mais ricos – é gerar empregos para a mão de obra paraguaia. Mais de 70% da população de 6,8 milhões de habitantes tem menos de 30 anos e boa parte ainda atua na informalidade.
A estratégia é elogiada pelo setor produtivo. Cartes, porém, enfrenta críticas por ter abandonado programas sociais, em especial no interior. Durante a passagem pela reportagem do Estado por Assunção houve um protesto contra o atual presidente – com direito a cartazes “Fora Cartes”. Uma recente pesquisa põe o índice de popularidade do presidente em 23%, um dos mais baixos da América Latina. Além disso, o socialista Fernando Lugo, deposto em 2012, é um nome que ganha força para as eleições de 2018.
O discurso do governo paraguaio é que o programa de maquilas visa a construir uma parceria com o Brasil. “A ideia é que nós venhamos a substituir os produtos que as empresas brasileiras hoje trazem da China”, diz o ministro da Indústria e Comércio do país, Gustavo Leite. Porém, segundo o vice-presidente do Foro Brasil-Paraguai, Junio Dantas, é impossível saber se o investimento no Paraguai substituirá empregos no Brasil ou na China. “É uma decisão do empresário.”
Aceleração. Entre as empresas que estão usando o Paraguai para substituir importações chinesas está a Riachuelo. Foi a rede brasileira que viabilizou a Texcin, indústria montada pelo paraguaio Andrés Gwynn. Hoje, a fábrica emprega 400 pessoas e produz 300 mil peças ao mês. Mas o contrato de dez anos com a Riachuelo prevê que, dentro de um ano e meio, a produção seja elevada a 1 milhão de unidades. Com isso, os funcionários chegarão a 1,5 mil.
Gwynn conta que teve a ideia de atrair a Riachuelo ao Paraguai ao ver a foto do presidente da empresa, Flávio Rocha, em uma banca de revista no Aeroporto de Guarulhos. O empresário ligou para a secretária de Rocha e, após alguns dias de insistência, conseguiu uma reunião de cinco minutos para apresentar as vantagens do Paraguai. “Acabamos conversando o dia todo”, lembra Gwynn.
Indústrias que enfrentam forte concorrência de produtos baratos vindos da Ásia – como materiais plásticos, brinquedos e confecções – estão entre as mais propensas a aproveitar as vantagens da lei das maquilas. Uma das pioneiras do movimento foi a X-Plast, que fechou a unidade no interior de São Paulo e se instalou há três anos em Ciudad del Este, a 4 km da fronteira com Foz do Iguaçu. Procurada, a empresa não respondeu aos pedidos de entrevista.
As marcas brasileiras Bracol e Fujiwara, de sapatos para trabalhadores industriais, decidiram aproveitar as vantagens de custo do Paraguai em 2014. Elas são sócias de Andrés Gwynn na Marseg. A empresa chegou a ter 1,5 mil empregados. Com a crise no Brasil, que afetou em cheio a indústria, cortando mais de 30 mil empregos apenas em montadoras, a Marseg reduziu os funcionários para 800.
Autopeças. As companhias internacionais de autopeças também estão migrando para o Paraguai. O sócio da Riachuelo no país, que também atua como cicerone para empresários estrangeiros, já ajudou a trazer seis fornecedoras de montadoras para o Paraguai. Entre essas companhias está a alemã Leoni, que produz chicotes elétricos.
O gerente da unidade da Leoni no Paraguai é o brasileiro Fábio Lopes da Silva. Ele conta que a maior parte da produção vai para montadoras instaladas no Brasil, onde a empresa mantém uma planta em Itu (SP), com 500 funcionários. Embora não haja planos para desativar a fábrica no Brasil, Silva diz que, com o tempo, a planta paraguaia se tornará mais importante. “Hoje, empregamos aqui 300 pessoas, mas o projeto é ampliar para mil colaboradores.”
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