Publicado em 25/04/2016
Fonte: Automotive Business
A renovação completa do portfólio da Fiat na América Latina foi iniciada este ano pelas pontas, na parte de cima com a picape Toro e embaixo como o compacto popular Mobi, ambos lançados no intervalo de dois meses entre fevereiro e abril. “Agora vamos trabalhar no recheio desse nosso sanduíche”, faz a analogia Stefan Ketter, presidente da Fiat Chrysler Automobiles, FCA, para os mercados latino-americanos (com exceção do México) e vice-presidente global de manufatura do grupo. Segundo ele, o ritmo será de um lançamento por semestre até 2018, com produtos novos, e foco também em aumentar as exportações. “Vamos aproveitar nossa grande vantagem que é a capacidade local de desenvolvimento independente da matriz, que poucos fabricantes têm aqui”, destaca.
Ketter avalia que a Toro e o Mobi são mostras distintas do que a FCA pode fazer no Brasil para o mundo. Com maior valor agregado e padrão de qualidade internacional, a Toro já tem interessados em países desenvolvidos, como os Estados Unidos. “Ainda estamos na fase de estudos se é possível exportar o modelo para lá”, explica o executivo – existem restrições quanto a impostos e emissões. “Mas o fato é que se não tivéssemos investido em uma fábrica entre as mais eficientes do mundo (em Goiana, Pernambuco, que também produz o Jeep Renegade nacional), onde é possível fazer esse tipo de veículo, não teríamos alcançado esse padrão e não atrairíamos esse interesse. Ninguém exporta carros para os Estados Unidos a partir do Brasil e nós poderemos ter essa capacidade”, pontua.
Embora com qualidades bem mais modestas, o Mobi também deverá ter forte presença em mercados que consomem carros de baixo custo. A Fiat espera vender o modelo em toda a América Latina, incluindo o México. Em escala gradual nos próximos 12 meses, cerca de 30% da produção do novo compacto deverá ser destinada ao exterior, o que pode significar algo entre 20 mil e 30 mil unidades por ano.
“Queremos nos tornar uma base de exportação. Nossa política é de construir um mercado de América Latina real, não só Argentina, que pode ser considerado como parte do mercado brasileiro. A verdade é que nunca fizemos isso, costumamos exportar só para o país vizinho. O plano é expandir esse horizonte para todos os países da região, incluindo os andinos, todo o Mercosul e o México”, afirma Ketter. Ele avalia que a FCA tem vantagens competitivas para isso: “Tenho certeza que só nós temos independência de design e engenharia regional para desenvolver carros próprios, as outras montadoras precisam muitas vezes importar plataformas e adaptar. Pela primeira vez estamos desenvolvendo no Brasil um centro de plataformas internacionais que podem ser usadas globalmente.”
Ketter avalia que ainda levará algum tempo para desenvolver mais mercados de exportação: “Nunca colocamos foco nisso. Por isso precisamos construir todo o processo e iniciar as negociações. Isso não será feito da noite para o dia.”
Próximos passos
Ketter diz que quase todos os novos desenvolvimentos da FCA América Latina serão centrados em duas plataformas principais. Uma delas, de tamanho médio, fica na fábrica de Goiana (PE), sobre a qual já são montados Jeep Renegade e Fiat Toro. Mais dois produtos, a serem lançados no próximo ano, deverão usar a mesma base. A plataforma compacta fica na antiga e modernizada unidade de Betim (MG), que dá origem a 85% dos carros produzidos na planta mineira. “Isso traz grande competitividade e flexibilidade, trabalhando com uma só plataforma não é necessário reinventar um carro a cada lançamento. Betim continuará sendo a nossa maior planta com investimentos constantes”, diz o executivo.
Cada novo carro que entra em produção em Betim traz consigo modernizações. No caso do Mobi, por exemplo, vários conceitos de automatização e produção eficiente que começaram a ser aplicados em Goiana agora também são introduzidos na planta que deu origem à Fiat no Brasil. Os processos de estamparia, solda e montagem final receberam atualizações e novos robôs com a chegada do Mobi, o que beneficia outros modelos que são feitos na mesma linha. Uma nova cabine de pintura entra em operação em agosto.
Atualmente apenas 60% da capacidade de produção de Betim está sendo utilizada. Ketter avalia que é um porcentual “até que bom” se comparado com a média de 50% de ociosidade de todas as montadoras no País. “É um nível muito perigoso e difícil de sustentar”, diz. Com duas paradas já feitas este ano, a planta mineira também executou um rodízio de funcionários, colocando 500 operários em treinamento para a produção do Mobi. “Estamos aproveitando toda a flexibilidade que Betim tem”, informa Ketter.
Retomada
Para Ketter, o desenvolvimento do novo ciclo de produtos da Fiat nos próximos meses deverá trazer de volta “naturalmente” a liderança de mercado para a marca no mercado nacional, posição perdida para a GM no primeiro trimestre. O executivo evita dar pistas dos próximos passos para não atrapalhar as vendas dos modelos que estão em linha e deverão sofrer alterações. Sabe-se que está prestes a ser lançado um motor três-cilindros que deverá equipar primeiro o Uno e depois se espalhar para o resto do portfólio com motorização de 1 litro. Também são esperadas grandes mudanças na família Palio: o hatch deve crescer e decretar o fim do Punto, segundo informações veiculadas pela imprensa especializada.
“Em tempos de crise não valem oportunismos que destroem valor, pois criam demandas insustentáveis. Participação de mercado é importante, mas não é a meta. O mais importante é manter o balanço positivo, ou não haverá ciclo de desenvolvimento de produtos nem plano de negócios que sobrevivam. Não podemos entrar num ciclo de destruição um do outro, precisamos criar valor”, analisa Ketter. Segundo ele, apesar da baixa do mercado brasileiro, a FCA se mantém rentável na América Latina desde o segundo semestre de 2015. “Estamos mantendo o mesmo nível neste primeiro trimestre”, diz. O executivo explica que a queda nas vendas da Fiat foi em parte compensada pelo sucesso do Jeep Renegade, que garantiu a rentabilidade. “Essa é a vantagem de ser uma empresa multimarca, com várias opções”, ressalta.
A direção da FCA aposta que o mercado brasileiro deverá “retomar rapidamente” o ritmo de crescimento assim que for resolvida a instabilidade política, pois isso traria a confiança de volta ao consumidor. “O consenso deste ano é de mercado total de 2 milhões de unidades, mas isso pode mudar muito rápido com qualquer medida de ânimo. Se o otimismo voltar o Brasil cavalga rapidamente para cima e em menos de três anos recupera os níveis de vendas anteriores, mas estamos preparados para sobreviver com menos. O que o setor precisa para crescer é de regras claras para política industrial, fiscal e de exportações, e isso só virá com estabilidade política”, analisa Ketter.
O executivo destaca que a prioridade de política para a indústria automotiva deveria ser centrar esforços na reindustrialização do setor de autopeças e ferramentaria. “Existiam mais de 100 ferramentarias quando saí do País, hoje existem menos de 20, por exemplo. Não é possível basear a produção de veículos em importações, vai ser um desastre se isso acontecer. É preciso reerguer essa indústria, é o que nos dá competitividade para criar uma base de exportação aqui”, destaca. “Nós podemos ajudar com técnica e equipamentos, mas o setor também precisa de ajuda financeira e mais qualificação de mão de obra.”
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