Publicado em 05/05/2015
Fonte: Portal G1
No Brasil, em 2015, quase 560 mil novos veículos nacionais foram licenciados e passaram a circular pelas ruas e avenidas do país, segundo a Associação Nacional de Fabricantes de Veículos Automotivos (Anfavea). O número é expressivo e afeta diretamente o meio ambiente com o aumento de resíduos sólidos dispersos na cidade. Na tentativa de mudar este cenário, o Centro Federal de Educação Tecnológica de Minas Gerais (Cefet - MG), localizado em Belo Horizonte, anunciou parceira com o Japão para implantação de uma unidade escola que vai desenvolver projetos de reciclagem automotiva.
O professor afirma que o projeto é o primeiro da América Latina, feito com o apoio da Agência Japonesa de Cooperação Internacional (JICA) e a empresa japonesa Kaiho Sangyo. A planta escola terá sede no Cefet II, no bairro Nova Gameleira.
A intenção, segundo o coordenador do projeto, Daniel Enrique Castro, é capacitar uma equipe própria e repassar o treinamento a novos profissionais de setores diversos. Em contrapartida, o centro de ensino oferece espaço e mão de obra. Tecnologias de reaproveitamento de peças e materiais dos veículos também serão desenvolvidas.
Conforme detalha Castro, no Japão, este processo começou em 2005, quando foi criada a lei de reciclagem de veículos no país. A intenção deles é expandir a tecnologia já desenvolvida e internacionalizar o uso de peças sobressalentes dos carros.
Diferente do que é feito nos Estados Unidos, por exemplo, que recicla automóveis por meio de trituração de todos os componentes, a tecnologia japonesa prevê o desmanche dos carros e a reutilização de cada item usado na montagem. A técnica possibilitaria, inclusive, maior lucro com o processo, com mais itens reaproveitados.
Apesar de se tratar de veículos, o mercado de empresas interessadas não se restringe a montadoras. As siderúrgicas, por exemplo, buscam o aço extraído na reciclagem. Um processo que pode diminuir o impacto ambiental negativo provocado pela extração de metais.
De acordo com o Instituto Aço Brasil, representante das empresas brasileiras produtoras de aço, cerca de 2,7 milhões de toneladas da forma bruta do produto foram produzidas em março desse ano. No primeiro trimestre, a soma era de, aproximadamente, 8,4 milhões de toneladas.
O custo do programa é alto. Segundo o coordenador, o investimento do Japão no centro de ensino é de U$ 1 milhão, o que inclui compra de equipamento, treinamento de pessoal e a transferência de tecnologia, que é a primeira capacitação oferecida pelos japoneses. A previsão é que, até dezembro de 2016, o espaço esteja pronto e funcionando em Belo Horizonte. Mas em março de 2016, uma comissão, ainda a ser definida, já deve ir ao Japão para iniciar o curso.
O lucro com o processo também pode ser grande. Segundo Kenichi Tamura, diretor da E-Square, empresa que participa da criação da planta escola no estado, o faturamento do Japão com o reuso das peças chega a U$ 3 bilhões. Mas o empresário faz questão de destacar que é preciso considerar a diferença no volume da frota nos dois locais, e, antes de tudo, a importância ambiental do projeto, que pode ser uma grande solução sustentável para todas as cidades.
Meio ambiente
Para o presidente da Organização Brasileira para Prevenção de Segurança Sustentável (OBPS), Júlio Avelar, a preocupação com a reciclagem vai além. Muitos veículos são roubados no país e metade deles não é recuperada, explica. "E, se não é recuperada, acaba por ser desmanchada de uma maneira ecologicamente e economicamente incorreta, ilegal", conclui.
Até por isso, para que a reciclagem seja eficaz no país, Daniel explica que é importante que haja uma lei de reciclagem de veículos. Dessa forma, tanto a forma de trabalho quanto a comercialização deste serviço será feita de forma mais eficaz e sustentável.
Em Minas Gerais, as discussões sobre o tema já começaram, mas a regulamentação correspondente, no momento é a de resíduos sólidos. Na opinião do professor, as regras são limitadas. Nos processos de reutilização, é possível reaproveitar itens não sólidos.
“Nós já tivemos uma reunião com a Feam [Fundação Estadual de Meio Ambiente], e começamos a vislumbrar essa possibilidade, porque a legislação é um ponto central”, diz Castro. E acrescenta que “nós temos uma legislação que permite a reciclagem [lei para resíduos sólidos], mas é muito trabalhoso adequar um empreendimento a essa legislação hoje”.
Como funciona a proposta da reciclagem automotiva
A unidade piloto de reciclagem automotiva que o Cefet-MG planeja implantar daria apoio para unidades de reciclagem de veículos no Brasil e treinamento de mão de obra especializada, além de investir em tecnologias no setor. O espaço também ficaria disponível para a visitas.
Todo tipo de automóvel, com qualquer tempo de uso, poderá passar pelo processo de reaproveitamento, segundo afirma Daniel Enrique. Uma análise avalia a qualidade das peças, que depois passam pela desintoxicação, que é a extração dos fluidos [óleos, por exemplo]. A partir daí, é feita a desmontagem e a separação de itens mecânicos e eletroeletrônicos. Se tudo estiver em boa condição de reuso, o veículo será 100% reciclado. Os itens são encaminhados à diversas empresas. O aço, por exemplo, voltaria para o setor siderúrgico.
Ao processo de reaproveitamento, os japoneses chamam de “mina urbana”, pois os componentes têm bastante valor agregado. Sobre os possíveis lucros permitidos pelo processo, o professor do Cefet esclarece que o retorno financeiro para a escola seria apenas para manutenção de instalações e investimento em tecnologia.
Produção e reciclagem de veículos
Em 2004, a produção de automóveis no Brasil foi de 1.777.642 unidades, segundo a Associação Nacional de Fabricantes de Veículos Automotivos (Anfavea). Dez anos depois, o número subiu para 2.502.293; um crescimento de cerca de 40%. O número de licenciamentos feitos no país em 2015 é de quase 600 mil. Os índices apontam o crescimento da frota, mas pouco se fala sobre a reciclagem destes produtos.
De acordo com Castro, a projeção de aumento de produção de veículos é crescente, e teria dobrado em um período de dez anos, chegando a mais de 40 milhões, atualmente. O que torna ainda mais urgente a iniciativa de reciclagem de carros. “Mesmo com altos e baixos, nós temos uma tendência de crescimento. Vai quadruplicar a produção de veículos”, diz Daniel.
“Não sabemos o que fazer com os veículos sem vida útil”, afirma o professor, apontando um dos transtornos enfrentados atualmente: “E o que acontece? Termina nos pátios do Detran, acumulando cada vez mais”.
A taxa de reciclagem nos países desenvolvidos, onde o mercado automobilístico é mais estável, é de 4% a 5% da frota ao ano, conforme exemplifica o coordenador do projeto piloto, para mostrar que, mesmo que o mercado se estabilize, a solução sustentável permanece necessária.
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