Publicado em 16/01/2014
A Anfavea poderá em breve perder a hegemonia de representar todos os fabricantes de veículos instalados no Brasil. Um grupo de montadoras que em breve vai iniciar operações industriais no País, liderado por Chery, JAC Motors e Jaguar Land Rover, não se considera bem representado pela associação e quer ficar onde está, na Abeiva, que reúne os importadores. Segundo reportagem publicada no jornal O Estado de S. Paulo no domingo, 12, para isso seria feita uma mudança do estatuto da entidade, que mudaria de nome para Abeifa, cujo final da sigla significa “importadores e fabricantes”, que assim passaria a abrigar também quem tem fábrica em território brasileiro. “A Abeiva confirma que estuda a possibilidade de ampliar sua atuação para uma entidade que atenda também às demandas de fabricantes, mas ainda não há uma definição a respeito desse tema”, disse por meio de nota Flavio Padovan, atual presidente da associação, que se encontra fora do País – ele também é diretor-presidente da Jaguar Land Rover para América Latina e Caribe.
Fontes ligadas à Abeiva afirmaram a Automotive Business que esses mencionados “estudos” estão bem avançados e que, a depender dos principais sócios da entidade, o novo desenho estatutário deverá ser aprovado em breve. Movimento que confirma essa tendência é da Chery, que começa sua produção no Brasil no fim do primeiro semestre e, no ano passado, havia deixado o quadro de associados da Abeiva, mas este mês voltou a fazer parte entidade, após ter desistido de sua filiação à Anfavea.
Não é o preço cobrado para se associar à Anfavea que está afastando da entidade alguns dos novos fabricantes. Segundo a mesma reportagem do Estadão de domingo, a joia seria de US$ 1 milhão, mas participantes do mercado afirmam que esse é um “valor de balcão” e que, na prática, o desembolso inicial seria “muito menor”. Luiz Moan, presidente da Anfavea, confirma: “Não divulgamos o valor, mas posso dizer que é menor do que foi publicado”, disse ele a Automotive Business. “Mas acho justo cobrar luvas pelo grande volume de trabalho que oferecemos”, acrescenta.
O que pesa de fato, segundo pessoas familiarizadas com a negociação, é a falta de representatividade que os associados menores teriam na Anfavea, dominada por quatro grandes fabricantes (Fiat, Volkswagen, General Motors e Ford) que têm mais de 65% das vendas no Brasil. “É melhor ser cabeça de sardinha do que rabo de baleia”, disse uma fonte em alusão à posição das novas fabricantes na Abeiva, onde detêm maior poder de decisão e ficariam diminuídas em meio ao gigantismo de alguns dos sócios da Anfavea.
Contudo, a diferença de tamanho entre uma sardinha e uma baleia não mudará com a formação de uma nova entidade de fabricantes. Fontes de mercado apostam que será muito difícil superar o peso de baleia que a Anfavea tem nas negociações junto ao governo em relação a políticas para o setor, como redução de impostos, criação de incentivos e regimes produtivos como o Inovar-Auto, que comprovam o poder de persuasão da associação das montadoras. A avaliação dos analistas é que dificilmente o governo atenderá a duas entidades antagônicas, com pleitos em direções contrárias. Nesse caso, deve prevalecer a força de quem emprega mais gente e tem mais influência sobre a economia nacional.
“A Anfavea tem 60 anos de história e um patrimônio importante, como o acompanhamento estatístico histórico do setor, oferta de informações aos sócios e atuação na defesa do setor”, avalia Moan. Ele destaca que não por outra razão continua a receber novos associados. Em 2013 chegaram Hyundai e DAF. “E outros vão vir, estamos negociando”, revela. É provável que a BMW, hoje na Abeiva, faça sua associação na Anfavea. A Audi, também filiada à associação dos importadores e que voltará a produzir no Brasil em 2015, já está há anos na Anfavea como marca subsidiária da Volkswagen.
O mais provável é que Chery, JAC e Jaguar Land Rover iniciem a Abeifa na qualidade de importadores e produtores – assim como já acontece desde sempre na própria Anfavea, onde estão filiadas quatro marcas subsidiárias sem produção local e quase todas as 28 empresas fabricantes também fazem importações próprias, que somam volumes bem maiores do que os dos 30 sócios da Abeiva hoje. Nos 21 anos de história da associação, sempre houve perda de representatividade com o êxodo de associados para a Anfavea quando estes instalavam fábricas no Brasil – foi assim com Mitsubishi, Nissan e Hyundai, só para citar três de muitos exemplos. Isso pode mudar agora com a criação da Abeifa, fortalecendo os pleitos da entidade.
Ainda que pouco provável, também é possível acontecer algum movimento de montadoras que consideram seus interesses mal representados na Anfavea irem procurar nova representação. Não faltam descontentes entre as 28 empresas associadas, especialmente as que chegaram depois dos anos 1990. Exemplo disso é a presidência da associação nacional das montadoras, que há mais de três décadas é dividida por apenas cinco delas – a cada três anos Fiat, Volkswagen, General Motors, Ford e Mercedes-Benz fazem o rodízio de presidentes.
“Tenho convicção de que na próxima gestão continuaremos a trabalhar unidos em prol do desenvolvimento da indústria”, aposta o presidente Luiz Moan, que nega qualquer racha na entidade – apesar de chamar de “missão impossível” o consenso obtido em todos os pleitos entregues ao governo no primeiro ano de sua gestão, como o Exportar-Auto, o Inovar-Máquinas, o programa de incentivos a carros híbridos e elétricos e o projeto de renovação da frota de caminhões. “Tudo aqui é feito por consenso”, garante.
Com relação à criação de uma “concorrente” para a Anfavea, Moan diz estar “tranquilo” e que, para ele, trata-se de “assunto velho”. Segundo ele, os representantes das duas associações conversam constantemente. “Já falamos sobre isso. As empresas são livres para se associar a qualquer entidade, ou nenhuma.”
Mas, seja na Abeifa, Anfavea ou nenhuma delas, quem produzir veículos no Brasil terá de necessariamente se filiar ao Sinfavea, o sindicato patronal análogo à associação das montadoras, que funciona no mesmo endereço em São Paulo. Legalmente, é o representante oficial e único dos fabricantes em questões sindicais e negociações trabalhistas. Mas segundo Moan esse não será um empecilho legal à nova entidade: é possível fazer a associação ao Sinfavea sem obrigação ser sócio da Anfavea.
Fonte: Pedro Kutney, AB
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