Publicado em 14/11/2013
Prestes a completar 83 anos, ele ainda acredita nesta possibilidade. "Mas acho que o país já está
perdendo mais essa janela de oportunidade", diz, criticando a falta de uma política de estímulo a carros elétricos.
Para
ele, o veículo nacional poderia usar o próprio etanol como fonte de energia, seguindo o princípio dos
elétricos a célula de hidrogênio, que não precisam ser recarregados na tomada.
Folha
- O Brasil tem uma das maiores empresas aeroespaciais do mundo, a Embraer, que foi fundada pelo sr. em 1969 e que hoje atua
em um segmento altamente tecnológico. Por que o país não tem uma marca própria de automóveis
sendo o quarto maior mercado consumidor?
Ozires Silva - O Conselho de Desenvolvimento Industrial [CDI], criado pelo então presidente
Kubitschek, nos anos 1950, tinha regras que jamais permitiriam a criação de um automóvel nacional. Eu
disse isso ao governo na época, mas fui voto vencido. Depois, quando caiu na minha mão a decisão de construir
aviões, pude seguir uma rota diferente do CDI e criar uma aeronave de concepção e marca locais.
Folha: Então a sua ideia inicial era fomentar uma montadora de carros brasileira?
Ozires Silva - Claro. Mas o governo fixou que o interessado deveria ter experiência, capital, recursos humanos, propriedade intelectual e posição no mercado externo. Com todas essas exigências, quem quisesse montar uma marca nacional seria desencorajado.
Folha: Até aíses nanicos dentro do cenário automobilístico, como a Noruega, aproveitaram essa recente onda da eletrificação dos carros para criar montadoras. O sr. acredita que a tendência possa trazer uma nova chance para uma marca de carros nacionais?
Ozires Silva - Acho que sim. Mas o país já está perdendo mais essa janela
de oportunidade, enquanto o mundo inteiro está se movimentando para desenvolver esse tipo de produto.
Sabemos que
é muito mais difícil empreender por aqui. Temos desvantagens como a complicação burocrática
e o custo Brasil.
Por isso ouvimos "vamos trazer a tecnologia de fora, vamos trazer automóvel de fora". Essa palavra
"trazer" nos põe numa situação de segunda classe. Mas podemos gerar coisas novas. Veja o exemplo
dos nossos aviões.
Folha: Como seria o carro elétrico nacional?
Ozires Silva - Existem várias soluções. Uma delas é o carro com motor elétrico movido a célula de hidrogênio, que já foi apresentado no Japão [e não precisa ser recarregado na tomada]. O problema desse sistema é a autonomia reduzida aos padrões a que estamos acostumados a rodar. Isso se deve também ao fato de o combustível ser gasoso, menos concentrado. O etanol líquido, por ter moléculas de hidrogênio em sua composição, poderia ser uma boa alternativa. Até porque já existe uma rede de distribuição desse combustível por todo o país. Com a tecnologia atual, seria possível isolar o hidrogênio do etanol.
Folha:Não seria muito caro?
Ozires Silva - Claro que um carro elétrico nacional com essa tecnologia será muito
mais caro que os veículos que eu posso comprar ali na esquina. Mas automóvel convencional só é
mais barato porque sua escala de produção é muito grande. Tente usinar um motor a combustão na
garagem da sua casa para ver o quanto ele não custaria. Você não pode pegar um troço absolutamente
novo e querer que ele comece a um preço inferior.
O sr. presidiu a Petrobras no final dos anos 1980, logo após
a criação do Pró-Álcool.
Folha: O que acha da atual política do biocombustível no Brasil?
Ozires Silva - É uma política errática, pois o preço do etanol não pode ser atrelado ao da gasolina. Enfrentei discussões sérias com o governo em 1985, mas fui voto vencido. Preguei que isso poderia trazer essa colisão no futuro.
O trabalho Cenários da industria Automotiva: Região Metropolitana de Curitiba, confirma igualmente a visão de Ozires Silva, que o Brasil não assumirá um papel de destaque na pesquisa e desenvolvimento de carros eléticos, que estará sob o domínio de países desenvolvidos.
Fonte: Felipe Nobrega – Folha de São Paulo
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