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Entre as medidas de proteção, governo poderá comprar produtos nacionais até 25% mais caros que importados
Martha Beck, Eliane Oliveira, Chico de Gois e Geralda Doca
BRASÍLIA. Para tentar abrandar o desânimo que abate o empresariado brasileiro, o governo anunciou ontem o Plano Brasil Maior, nova política industrial ancorada na proteção do setor produtivo contra a concorrência predatória e as crises globais que se anunciam. São R$24,5 bilhões em desonerações da folha de pagamento, das exportações e de investimentos até o fim de 2012, medidas de defesa comercial, financiamento a condições vantajosas e preferência de compra nas licitações públicas, por preço médio até 25% maior, às empresas que produzam aqui com conteúdo nacional e valor agregado.
A uma plateia de empresários - que elogiaram as medidas, apesar de considerá-las insuficientes -, a presidente Dilma Rousseff pediu ânimo e ousadia para combater a concorrência desleal imposta por bens importados que inundam o país.
- Iniciamos uma cruzada em defesa da indústria brasileira diante de um mercado internacional com uma competição, na grande maioria das vezes, desleal e predatória - disse ela, que foi aplaudida e acrescentou: - A indústria nacional tem em mim uma aliada, uma parceira consciente das dificuldades, mas também das potencialidades do nosso setor produtivo.
A presidente também deixou claro mais uma vez que sua prioridade é o crescimento da economia, com inclusão social, mas ressaltou que não abrirá mão do controle da inflação e da responsabilidade fiscal:
- Aos que pensam que, em um momento de incerteza internacional como o que vivemos, o mais prudente é não agir e esperar a onda passar, eu contra-argumento, amparada na experiência que tivemos durante o período do governo do presidente Lula, em 2008 e 2009: é justamente em uma situação de tensões no mundo que devemos mostrar, além do indispensável bom senso, uma boa dose de ousadia.
No pacote, estão medidas que vinham sendo cobradas pelos empresários como a desoneração da folha de pagamento de empresas. Ela, porém, será temporária e restrita aos setores de confecções, moveleiro, software e calçadista. O governo vai zerar a contribuição previdenciária patronal de 20% que incide sobre a folha de pagamento das empresas e criará uma nova cobrança (que varia entre 1,5% e 2,5%) sobre o faturamento. O Tesouro ficará encarregado de colocar R$1,6 bilhão na Previdência para cobrir uma possível perda.
Também foi criado o programa Reintegra, que concede crédito imediato de 3% sobre receitas de exportação de bens manufaturados, com renúncia fiscal estimada em R$7 bilhões. A lista de produtos industrializados que terão direto ao benefício será regulamentada.
- É algo inédito, capital de giro na veia da indústria. País desenvolvido é país que tem indústria. Vamos defender a nossa - disse o ministro do Desenvolvimento, Fernando Pimentel.
'Quanto menos competidores, maior a chance de sobrepreço'
O governo comprometeu-se ainda a regulamentar a preferência de compra de produtos nacionais, aprovada no ano passado pelo Congresso, com preço até 25% maior. Começará pelas áreas de saúde, defesa (compra de fardas e coturnos, por exemplo, na qual a China vem ganhando espaço) e tecnologias da informação e de comunicação.
Pimentel destacou que a ideia é estabelecer condições que garantirão um tratamento diferenciado a empresas que geram empregos, fabricam itens com maior valor agregado e que usem, em sua maioria, insumos nacionais. Serão fixadas margens máximas de preços para diferentes setores, assim como percentuais de nacionalização.
Especialistas e oposição, em geral, saudaram a preferência nas compras, mas lembram que ela precisa vir com medidas que reduzam distorções do câmbio e deficiências de infraestrutura.
- Acho bem-vinda a iniciativa de dar preferência a produtos nacionais nas compras governamentais, mas desde que não distorça as oportunidades das cadeias produtivas. Não adianta abrir uma porta e fechar outras - afirmou o líder do PSDB na Câmara, Duarte Nogueira (SP).
- Muitos países usam este expediente para reativar ou desenvolver a sua economia. Os EUA fazem isso desde 1933. O mesmo acontece na China, Índia e Coreia. Se fizer de maneira inteligente, vai poder agregar valor à indústria. Mas se for usado de maneira errada, pode dar margem à corrupção - ponderou Antonio Corrêa de Lacerda, professor da PUC-SP.
O advogado Jonas Lima, especialista em licitações, advertiu que a falta de normas traz insegurança jurídica para fornecedores estrangeiros. Ele alertou que a preferência tende a reduzir o número de competidores e pode levar a condições de contratação aquém do desejado:
- Quanto menor o número de competidores, maiores as chances de sobrepreço.
O Brasil Maior também prorroga desonerações do IPI para a construção civil, bens de capital, caminhões e veículos comerciais leves do fim de 2011 para o fim de 2012, além de zerar o prazo para que as empresas aproveitem créditos de PIS/Cofins. O BNDES também entrou no conjunto de ações com reforço nas linhas de financiamento e de capital de giro com juros reduzidos. Um orçamento estimado de R$500 bilhões entre 2011 e 2014 do banco estará afinado com as diretrizes da política industrial.
Para o setor automotivo, está sendo criado um novo regime de incentivos, no qual reduções do IPI estarão atreladas a investimentos em inovação e produção de conteúdo local. Pimentel adiantou ainda que, provavelmente este mês, sairão incentivos tributários para os setores de semicondutores e de redes de telecomunicações.
O ministro da Fazenda, Guido Mantega, previu que a crise nos países ricos deve durar mais três anos e defendeu proteção.
- O mercado brasileiro deve ser usufruído pela indústria brasileira e não pelos aventureiros que vêm de fora.