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Enquanto a indústria local retoma espaço na média, presença externa sobe em alguns segmentos
Marta Watanabe
O consumo doméstico aquecido e a manutenção de um real valorizado em relação ao dólar fizeram alguns segmentos da indústria nacional continuar a perder espaço para os importados no mercado interno no primeiro trimestre, na comparação com o último trimestre de 2010. A perda aconteceu principalmente em setores fabricantes de bens de consumo, como têxtil, vestuário, calçados, madeiras, móveis, automóveis e máquinas para escritório.
O recuo na participação da indústria nacional nesses segmentos chama a atenção porque esses setores seguiram tendência inversa da indústria geral. Levando em conta todos os segmentos industriais, a participação dos importados no mercado interno foi de 20,6% no acumulado de janeiro a março deste ano, o que representa queda em relação ao último trimestre de 2010, quando as importações atingiram 21,1% do mercado interno de industrializados. A recuperação foi puxada por setores como o de borracha e plásticos, no qual a participação dos desembarques recuou de 17,2% para 16,7% no mesmo período. O setor de máquinas e equipamentos, por outro lado, apresentou recuo na participação dos bens importados, que passaram de 34,4% para 33,6% na mesma comparação.
O levantamento é da LCA Consultores, com base em dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) e da Fundação Centro de Estudos do Comércio Exterior (Funcex).
No setor têxtil, porém, a participação dos desembarques foi de 21,9% no acumulado de janeiro a março deste ano, acima dos 21,6% registrados no último trimestre de 2010. No segmento de calçados e couro a fatia dos importados ainda é relativamente pequena, mas cresceu de 9,9% nos últimos três meses de dezembro para 10,2% no primeiro trimestre de 2011. No segmento de máquinas para escritório e equipamentos de informática a fatia dos itens comprados no mercado externo saltou de 38,1% para 42,1% no mesmo período.
José Augusto de Castro, vice-presidente da Associação de Comércio Exterior do Brasil (AEB), acredita que a perda de espaço da indústria nacional nesses segmentos durante o primeiro trimestre é resultado da decisão de um número cada vez maior de empresas de importar.
Os setores mais afetados são os fabricantes de bens de consumo e os de mão de obra intensiva, que perderam competitividade nos últimos anos em razão do aumento real de salários, diz. Outro dado que demonstra a decisão de importar em vez de comprar do fornecedor nacional, argumenta, está nas importações de bens de consumo em ritmo muito mais forte que a compra do exterior de matérias-primas e intermediários. Isso aconteceu durante todo o primeiro quadrimestre, em cada um dos primeiros quatro meses do ano.
No acumulado de janeiro a abril, o valor médio diário importado de bens de consumo cresceu 34,8% em relação ao primeiro quadrimestre de 2010. No mesmo período, a importação de matérias-primas e intermediários teve elevação, mas cresceu em ritmo bem menor, de 21,3%. Considerando o total das importações, houve aumento de 27,1%.
Com o mercado doméstico ainda aquecido a importação de bens de consumo é favorecida. O crescimento da importação desse tipo de bem em ritmo mais forte que a de matérias-primas e bens intermediários mostra que há uma opção por importar o bem acabado em vez de fabricá-lo no Brasil, explica Castro. A valorização do real em relação ao dólar acentua o movimento. À medida que aumenta a expectativa de manutenção da relação cambial, há mais segurança para importar. É como uma taxa de câmbio garantida.
Para o presidente da Associação Brasileira da Indústria Têxtil (Abit), Aguinaldo Diniz Filho, o avanço dos importados no primeiro trimestre significa que a indústria nacional está perdendo terreno num mercado interno ainda crescente. O setor tem 97% de sua produção voltada ao consumo doméstico e gerou no primeiro quadrimestre menos emprego do que no mesmo período de 2010.
Diniz Filho diz que o setor está preparado para produzir mais. O segmento investiu no ano passado um total de US$ 2 bilhões. Temos tecnologia, design e moda, mas perdemos com o custo da folha de salários e com o câmbio. Segundo dados da Abit, o setor fechou o quadrimestre com importações de US$ 2 bilhões, valor 33,1% maior do que o US$ 1,5 bilhão referente ao mesmo período do ano anterior. O déficit do setor no acumulado de janeiro a abril foi de US$ 1,5 bilhão, valor 30% maior que o do ano passado. A entidade estima que o setor terminará 2011 com déficit de US$ 6 bilhões.
No setor de calçados a perda de espaço dos fabricantes nacionais no mercado interno já começa a contribuir para a redução no saldo de contratações do segmento. Segundo Heitor Klein, diretor da Abicalçados, que reúne a indústria calçadista, o saldo de admitidos e demitidos em janeiro foi de 7 mil trabalhadores. Em fevereiro o saldo caiu para 6,7 mil empregados e, em março, para 3,6 mil trabalhadores. Ele lembra que o setor já havia sofrido impacto de produção em razão da perda de exportações.
Dados da Abicalçados indicam que houve aumento de 60% no total de calçados importados no primeiro trimestre de 2011, na comparação com o mesmo período de 2010. Em volume de pares, a alta foi de 24%. Levando em conta não só calçados acabados como também importação de partes e peças, o crescimento foi de 10%.